São Paulo – O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara, visitou os Emirados Árabes Unidos na última semana e confirmou que seu pai, o presidente Jair Bolsonaro, vai viajar ao Oriente Médio no final de outubro. A agenda irá incluir Emirados, Arábia Saudita e Catar. “O primeiro país da região que ele (o presidente) vai visitar é os Emirados. Falei com o chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, que me autorizou a divulgar”, disse o parlamentar em entrevista exclusiva à ANBA no sábado (03), por telefone, antes de retornar ao Brasil no domingo (04).
Os Emirados têm promovido uma forte aproximação diplomática do Brasil. Em Abu Dhabi, o deputado teve reuniões com uma série de autoridades e discutiu comércio, ratificação de acordos, a situação política do Oriente Médio, cooperação, a possibilidade de venda do avião Embraer KC-390 e até a indicação de um adido militar brasileiro. Para ele, o país árabe pode se tornar um parceiro estratégico do Brasil na região e um polo de distribuição de produtos nacionais. Eduardo agradeceu e fez questão de destacar o trabalho do embaixador nos Emirados, Fernando Igreja, que estava ao seu lado na entrevista. O chefe do escritório internacional da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Rafael Solimeo, também acompanhou a conversa.
Ele tratou também das tensões geopolíticas na região. “Há uma preocupação com o Irã. Um receio de elevação da tensão, principalmente em virtude dos últimos acontecimentos, sanções norte-americanas com relação ao programa nuclear iraniano”, declarou. Além disso, Arábia Saudita e Emirados estão com relações estremecidas com o Catar, e os três serão destinos da futura viagem do presidente. Na avaliação do parlamentar, o Brasil pode ajudar a “estreitar algum diálogo”. “Quem sabe o presidente [Jair Bolsonaro] seja ‘o conciliador do Oriente Médio’”, afirmou.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
ANBA – Qual o principal objetivo de sua viagem aos Emirados Árabes Unidos?
Eduardo Bolsonaro – Foi um convite feito pela embaixadora dos Emirados no Brasil, sra. Hafsa [Al Ulama], e faz parte de uma aproximação do Brasil com o país. É notória também a confirmação da viagem do presidente Jair Bolsonaro para a região na última semana de outubro. Ainda não tem o dia exato. Ele vai vir da Ásia, a expectativa – não é 100% certo – é que venha para cá após uma viagem ao Japão.
O primeiro país da região que ele vai visitar é os Emirados, e foi confirmado agora, nesta reunião [sábado, 03] com o chanceler [do país], Abdullah Bin Zayed Al-Nahyan (foto do alto). Falei com o chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, que me autorizou a divulgar. É uma resposta às sinalizações feitas pelos Emirados. A primeira embaixadora que o presidente recebeu, ainda no gabinete de transição, foi a embaixadora dos Emirados, e o primeiro chanceler da região que foi ao Brasil foi o chanceler Abdullah Bin Zayed.
Depois, ele irá para a Arábia Saudita, onde terá um encontro, muito provavelmente, com [príncipe-herdeiro], Mohamad Bin Salman. O último país da região que irá visitar vai ser o Catar.
Qual expectativa para essas viagens? Que temas o presidente irá tratar? Já há uma agenda prévia de compromissos, expectativa de assinatura de acordos?
Existem vários acordos sendo elaborados, principalmente pelo Itamaraty. É aconselhado que eu não me antecipe muito em detalhes, porque se me antecipar e o acordo não vier a ser assinado, pode ser uma “bola fora” da minha parte. Mas seriam acordos na área de comércio, ciência e tecnologia, dentre outros, talvez militar. As expectativas são as melhores possíveis.
Recebi uma demanda da congressista Amal Al Qubaisi, presidente do Conselho Nacional Federal (espécie de Parlamento). Ela falou para eu dar uma olhada em como anda a tramitação do acordo anti-bitributação, que já foi assinado (em novembro de 2018) e está neste momento na Casa Civil [da Presidência]. Depois da Casa Civil, ele vai para a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara. Eu, como presidente da comissão, já me comprometi que, chegando à minha mesa, vou dar celeridade para a relatoria desse acordo, para que ele produza seus efeitos, após a chamada internalização (ratificação).
Confesso que estou impressionado com o que estou vendo aqui [em Abu Dhabi]: uma qualidade de vida incrível, estradas perfeitas, pessoas educadas, nada pichado nas ruas, tudo limpinho, a qualidade dos carros é altíssima. Enfim, acho que é um país que é um exemplo de sucesso. A gente tem que estudar essa fórmula para tentar ver se aplica um pouco no Brasil e transforma o Brasil em um pouquinho de Abu Dhabi.
Quais outras reuniões o senhor teve nos Emirados? O senhor teve uma reunião com o vice-ministro da Defesa?
Com Matar Salim Al Dhaheri (subsecretário do Ministério da Defesa), que foi bem interessante. Aqui em toda a região, não só com relação às autoridades, mas conversando com garçons, peguei um pessoal da região, há uma preocupação com o Irã. Um receio de elevação da tensão, principalmente em virtude dos últimos acontecimentos, sanções norte-americanas com relação ao programa nuclear iraniano. Ressalto que o Brasil, durante uma reunião dos Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), fez questão de não apoiar o programa nuclear iraniano. O Brasil retirou do texto essa parte da declaração conjunta dos planos dos Brics.
Mas a conversa com ele foi bem interessante. Além do Irã, uma vontade mútua de cooperação militar. Falei também sobre o KC-390 (avião militar de transporte da Embraer), que há o interesse do Brasil na venda desse produto. Se for possível, colocar essa tratativa quem sabe até no nível presidencial, por que não, assumindo um compromisso. A gente espera ter um grande retorno porque é um avião excelente. Além disso, falamos sobre a perspectiva de [indicar] um adido militar brasileiro para a região, uma iniciativa que começou no governo [do ex-presidente Michel] Temer e há uma boa expectativa de isso ser feito em breve.
Qual seria a função desse adido militar na região?
Ele coloca o Brasil a par de todas as questões militares da região. Acaba sendo uma ferramenta de aproximação entre países. Assim como nós, do lado sul-americano temos um problema, por exemplo, com a Venezuela, aqui também há um problema semelhante com o Irã, guardadas as devidas proporções e os devidos detalhes. Mas são líderes que, por vezes, em algumas atitudes, preocupam os países vizinhos. Aqui certamente não é diferente. A gente espera que se encontre uma saída pacífica. A guerra não interessa a nenhuma das partes. Não é isso que se deseja, mas aquilo que for possível para evitar o apoio principalmente a grupos terroristas aqui na região, o Brasil estará junto com os Emirados.
O Brasil assumiu o compromisso de alguma medida pontual em relação com questão do Irã?
Não. Veja bem, a minha função aqui, eu sou parlamentar, presidente da Comissão de Relações Exteriores, tenho até uma certa preocupação de não invadir assuntos do Executivo. Mas não tenho poder de fazer algum tipo de declaração nesse sentido. Estou passando minha perspectiva, o que foi conversado, um pouquinho da ideia, pelo que conheço do presidente Jair Bolsonaro, um pouquinho do que conversei com o chanceler Ernesto Araújo.
O senhor conhece um pouquinho o presidente Jair Bolsonaro….
É, um pouquinho…. (risos). Mas tem algumas questões que a autorização para serem faladas é do embaixador Fernando Igreja, que está aqui do meu lado.
O senhor vai visitar algum outro país da região nesta viagem?
Não, infelizmente já estou retornando ao Brasil amanhã (ontem), domingo (04). Gostaria de ficar mais tempo, porém, a gente tem o segundo turno da reforma da Previdência para votar [esta semana na Câmara] em Brasília. Mas certamente fica meu desejo e eu acredito que não vai demorar muito para eu voltar à região.
Agora, o senhor assumindo a embaixada do Brasil em Washington não vai poder visitar os Emirados.
Não… já tem convite para visitar sim (risos). Tem a questão da embaixada americana. Minha indicação pelo presidente ainda falta ser referendada pelos senadores. E qualquer que seja a decisão dos senadores, isso não vai evitar que a gente trabalhe na aproximação entre os Emirados Árabes e o Brasil.
O senhor acha que é possível os Emirados se tornem o principal parceiro do Brasil na região, dentro dessa articulação que o próprio governo dos Emirados está fazendo?
Sem sombra de dúvida. É um país que teve toda essa sinalização que falei com a embaixadora, com o chanceler Abdullah Bin Zayed, de ter ido ao Brasil. Tem tudo para dar certo e transformar os Emirados no “hub” de entrada dos produtos [brasileiros] aqui na região, já que eles dominam vários contatos com países da região, com os vizinhos árabes e também, principalmente, com a Índia, a maior democracia do mundo. Tem tudo para dar certo para expandir nossos mercados. E também, por que não, para caminharmos lado a lado nas questões políticas daqui da região. Acho que os Emirados têm muito em comum com o Brasil nas questões das defesas das liberdades.
Só para concluir, o senhor disse que o presidente vai para os Emirados, Arábia Saudita e Catar. Agora, os Emirados e a Arábia Saudita andam estremecidos com o Catar. Daria para o senhor falar um pouquinho sobre como o Brasil lida com essa questão? Não pode criar algum tipo de problema pelo fato de estar visitando o Catar e os demais países ao mesmo tempo?
De repente, quem sabe, vire uma situação oposta, de o Brasil ser um ente de união entre os países. Em estreitar algum diálogo. Sei que é difícil, existem os detalhes entre os países da região. É difícil o Brasil vir do outro lado do oceano e querer ditar alguma regra, não é isso que estou falando. Mas, de repente, fazer algum tipo de estreitamento de relação: falar bem de um, bem com o outro. Enfim, o Brasil pode desenvolver um papel que pode ser bem interessante nesta relação. O Catar tem uma situação totalmente diferente do Irã e, quem sabe, renda alguns bons frutos neste sentido essa visita do presidente Jair Bolsonaro. Quem sabe o presidente seja “o conciliador do Oriente Médio”.
Tem alguma outra coisa que o senhor tenha visto ou conversado que queira destacar desta viagem?
Acho que depois dessa visita do presidente vai cair de vez por terra aquela questão de qualquer tipo de retaliação dos países árabes sobre a mudança da embaixada [do Brasil em Israel] de Tel Aviv para Jerusalém. Acho que não há qualquer tipo de animosidade com o mundo árabe, inclusive a mudança da embaixada seria para Jerusalém Ocidental, que é a parte que não é discutida com a Palestina.
Acho que vai corroborar para nossa imagem de um país pacífico, que busca a amizade, o estreitamento de relações com o mundo árabe. Acho que vai ser bem benéfica e para botar um ponto final neste tipo de rumor que eu, particularmente, nunca levei a sério, porque eu nunca vi nenhum xeique e nenhum líder de algum país daqui da região falando mal do presidente Jair Bolsonaro, ou dizendo que ia fazer uma retaliação comercial de produtos brasileiros quando da concretização dessa mudança da embaixada que eu, Eduardo, particularmente, dou como certa. A questão não é se, mas quando vai acontecer a mudança da embaixada.
O senhor falou sobre a questão de Jerusalém e do Irã, que são dois dos problemas mais sensíveis do Oriente Médio. O Brasil tem boas relações com todos os países da região, principalmente comerciais. Não é um pouco perigoso para o país escolher um lado nessas questões?
Acho que não. Vou usar a máxima de Vespasiano (imperador romano): “Pecunia non olet”, ou “dinheiro não cheira”. É claro que a gente não vai fazer comércio com país que seja refém do tráfico de drogas, longe disso. Mas não impede de fazermos comércio e termos nossas ressalvas ou nossas críticas pontuais. É igual você vender um apartamento para o vizinho. Você não precisa concordar com tudo que o vizinho faça. Se for do seu interesse e ele tiver dinheiro para comprar, por que não? Acho que não impede a liberdade de expressão. Óbvio, que não convém ir a fundo a ponto de causar um entrave judicial. Mas imaginamos a seguinte situação: quantos bilhões de dólares o Brasil vende para os EUA em alumínio? São algumas poucas dezenas de bilhões, 15, 16. Estou chutando um número mais ou menos, mas é o que faço ideia, são uns bons bilhões de dólares por ano. Imagine se o presidente [Donald] Trump fala para o Brasil: Brasil, se você não mudar a embaixada para Jerusalém, vou cortar pela metade a importação de alumínio brasileiro. É… é uma questão de soberania a questão da embaixada. É uma decisão do presidente. Acho que não tem problema nenhum nessa questão. É óbvio, envolve uma certa polêmica, mas é uma promessa de campanha que o presidente Jair Bolsonaro irá cumprir e que não deverá demorar tanto.