São Paulo – O Brasil tem uma lição de casa a fazer em diversos setores da economia se quiser continuar atraindo investimentos do exterior. Esse foi o tom dos painéis do Brazil Summit, conferência sobre os rumos da economia brasileira organizada pela revista britânica The Economist que aconteceu nesta quinta-feira (24), em São Paulo.
Investimentos em infraestrutura, principalmente em mobilidade e saneamento básico, além de educação, sustentabilidade e reformas tributária e da previdência foram os principais itens levantados, mencionados em momentos diversos ao longo dos painéis da manhã.
Para o ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy (em destaque na foto acima), é preciso haver um esforço conjunto para simplificar os processos de tributação do País. “É tarefa da sociedade como um todo esse trabalho de simplificação. Só vamos chegar lá, num país mais justo, mais ágil, mais simples, se houver um esforço conjunto do Judiciário, do governo e da iniciativa privada”, declarou o economista no primeiro painel do dia, Liderando para o longo prazo – Prosperidade compartilhada.
Levy afirmou também que a batalha ideológica sobre o meio ambiente não atinge o setor privado. “O barulho político não chega a interferir, o nosso empresariado [do agronegócio] é muito maduro para isso”, opinou, ao falar de agropecuária sustentável.
No mesmo painel, Marcos Lutz, diretor-presidente do grupo privado Cosan, afirmou que “projetos sérios encontram capital estrangeiro e doméstico”, e que o Brasil tem “uma infraestrutura a desenvolver”, mencionando principalmente o saneamento básico como um investimento estratégico de longo prazo. Ele também falou que é preciso simplificar os processos para o empreendedor, e mencionou privatizações, concessões e parcerias público-privadas como formas de o mercado financiar projetos de infraestrutura.
Ana Paula Vescovi, economista-chefe do Santander, complementou a fala do executivo. “A infraestrutura tem um duplo papel, de crescimento e produtividade a longo prazo. O investimento em mobilidade traz eficiência de deslocamento e acesso e bem-estar social, e o saneamento básico reduz a desigualdade social e os gastos com saúde, além de reduzir impactos ambientais. Não se pode cair na armadilha de crescer, se desenvolver, sem cuidar das pessoas”, afirmou.
O segundo painel, Perspectivas Econômicas, trouxe os temas de reforma tributária e da previdência. O economista-chefe da Verde Asset Management, Daniel Leichsenring, disse que “uma reforma tributária ampla reduziria o risco tributário para investimentos no Brasil”, e que é preciso “focar na educação e no capital humano para o longo prazo”.
Já a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, declarou que para a reforma tributária acontecer, seria necessário rever uma série de regras específicas e exceções, e que é muito importante haver um trabalho sério de comunicação do governo nesse sentido. Sobre a reforma da previdência, ela disse que “é muito importante para virar a página da agenda política, para poder avançar em outros temas”. Segundo Latif, “é essencial estabelecer prioridades e ter uma ampla opção de reformas”.
O mediador do painel perguntou “de que forma a atual bagunça política, o ruído, afetam o empresário?”. Latif afirmou que não vê uma tremenda preocupação de forma geral com os ruídos. “A confiança do empresário [no Brasil] não é nenhuma maravilha, mas está avançando”, avaliou. Ela também disse que o investimento em educação deve ser uma prioridade para haver mão de obra qualificada.
Arthur Carvalho, economista-chefe da Morgan Stanley para a América Latina, disse que “a confusão externa gera um pouco de falta de confiança no investimento externo, mas o fato de o Brasil ser uma economia fechada faz com que a crise externa não afete tanto o mercado”.
Hipoteticamente
O terceiro painel da conferência trouxe o tema O Mundo Se…, e levantou uma série de hipóteses sobre o futuro da economia mundial e como isso poderia afetar o Brasil. Ana Carla Costa, sócia da Oliver Wyman, declarou que a recessão global pode afetar o Brasil. “Mas temos a capacidade de consertar os motores de crescimento doméstico, não acredito em uma reforma tributária ampla, mas uma simplificada, e o cenário continua com esse otimismo cauteloso, com estimativa de crescimento de até 2%”, colocou.
Sobre a possibilidade de Donald Trump perder a reeleição no ano que vem, Christopher Garman, diretor administrativo do Eurasia Group para as Américas, avaliou que “talvez as agendas entre Brasil e Estados Unidos fiquem mais paradas, pode deixar de ter um ganho, mas apesar da coligação Trump-Bolsonaro, o que está na agenda hoje não é tão transformativo”.
Avaliando o cenário das eleições argentinas, Ana Carla disse que o Mercosul pode perder tração se o kirchnerismo voltar ao poder. “Existem acordos específicos a serem feitos, há um espaço enorme para expansão da agenda comercial, temos de fazer um dever de casa interno”, considerou.
Perante as revoltas populares que estão ocorrendo em países vizinhos como Chile, Bolívia e Equador, os painelistas avaliaram que sim, existe um risco de as manifestações voltarem a ocorrer também no Brasil, mas foi ponderado que com a polarização, haveriam também “manifestações pró-governo”. “Os fatores da revolta estão aí, as razões do desencantamento da chamada nova classe média desde 2013, que seriam educação, segurança e saúde, não apresentaram melhora”, disse Garman.
Meio Ambiente
A Maior Floresta da Terra – O Futuro da Amazônia foi tema do quarto painel da conferência. Nele foram discutidas as questões ambientais como desmatamento, a ocupação de terras públicas e a mineração em terras indígenas, e de que forma as empresas e a sociedade civil poderiam atuar a favor de um desenvolvimento sustentável.
Para Mauricio Voivodic, diretor-executivo da WWF-Brasil, nos últimos doze meses, a imagem ambiental do Brasil foi extremamente sacrificada. “Com o desastre de Brumadinho, as queimadas e agora o derramamento de petróleo no Nordeste, isso sacrifica a sociedade civil, e não o governo. Para o investidor estrangeiro, compromete, acordos internacionais podem ser sacrificados, pode haver boicote por parte de empresas estrangeiras”, avaliou.
O fundador da Fama Investimentos, Fabio Alperowitch, disse que é um mito que o investimento sustentável seja menos rentável. “90% dos estudos dizem que são mais ou igualmente rentáveis, e os investimentos sustentáveis são menos arriscados que os não sustentáveis”, disse. Para ele, temas como a sustentabilidade e os direitos humanos foram totalmente polarizados, mas são temas que importam a toda a sociedade. “É preciso trazer o mercado financeiro para participar dessas discussões que são de extrema relevância para todos”.
A ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também participou do painel. Segundo Silva, um estudo da USP afirma que 70% da economia da América do sul depende das chuvas da Amazônia. “O agronegócio pode fazer a diferença na região porque o desmatamento é prejudicial aos negócios. É preciso criar uma certificação de origem, e que o consumidor exija dos produtos, além de qualidade técnica e sanitária, valores éticos e de responsabilidade social e das populações indígenas”.
Na parte da tarde, o Brazil Summit teve painéis com o ministro da Justiça, Sergio Moro, e com a ex-procuradora geral da República, Raquel Dodge, entre outros nomes. Para a programação completa do evento, acesse o site. A Câmara de Comércio Árabe Brasileira apoiou o evento e seus associados tiveram desconto na inscrição. Participaram da conferência pela entidade a diretora de Marketing e Estratégia, Janine Bezerra de Menezes, a gerente de Inteligência de Mercado, Ana Becker, e o diretor Daniel Hannun.