Giuliana Napolitano
São Paulo – A desvalorização do dólar tem impacto direto na economia dos países árabes. Não só pelo fato de influenciar as receitas da principal fonte de recursos do Oriente Médio, o petróleo, mas também porque altera os preços dos produtos norte-americanos que são negociados na região. Com isso, analistas esperam que as exportações dos Estados Unidos para o Oriente Médio e Norte da África voltem a crescer, depois de anos de queda.
"Com certeza os EUA podem se beneficiar da queda do dólar e vender mais para o Golfo Arábico e outros países da região", afirmou ao jornal árabe Gulf News o economista Mohammed Asumi.
O estremecimento das relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Oriente Médio nos últimos anos – em razão, principalmente, dos conflitos entre israelenses e palestinos, da guerra no Iraque e também dos atentados terroristas de 11 de setembro – tem feito os países árabes diminuírem as importações de produtos norte-americanos.
Dados do Departamento de Comércio de Washington mostra que, de 1997 para cá, as vendas para o Oriente Médio e Norte da África caíram cerca de 10%, para US 23,5 bilhões. No caso da Arábia Saudita, por exemplo, a participação de bens dos EUA na pauta de importações do país diminuiu de 18% em 2001 para apenas 11% no ano seguinte.
Isso porque os países redirecionaram as compras externas para outras regiões, principalmente para a Europa, lembra o presidente da Câmara Americana de Comércio de São Paulo (Amcham), Sérgio Haberfeld. Ele acredita, porém, que agora os negócios devem voltar, especialmente no Iraque. "Sem dúvida, a desvalorização do dólar deve aumentar ainda mais a participação de empresas norte-americanas na reconstrução do país", declarou à ANBA.
Dólar X Euro
Os recursos disponíveis para as importações, no entanto, devem diminuir. Isso porque a desvalorização do dólar reduz as receitas externas dos grandes exportadores de petróleo. É o caso dos países que fazem parte do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG), união aduaneira que engloba Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã. O bloco concentra quase a metade de todas as reservas de petróleo do mundo, que hoje estão em bilhões de barris.
Os preços do petróleo são atrelados ao dólar e, desde a década de 60, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) discute formas de compensar as variações na cotação da moeda e tentar estabilizar as receitas locais. Alguns especialistas defendem a mudança da vinculação ao euro.
Em artigo à revista Middle East Economic Survey (Mees), o consultor do Ministério de Energia e Indústria do Catar, Ramzi Salman, lembra que os fortes reajustes dos preços do petróleo que ocorreram nos anos 70 foram motivados pela tentativa de reduzir as perdas provocadas pela desvalorização do dólar no período. Ele contou ainda que, na época, alguns países árabes decidirem vincular a cotação da commodity a outras moeda, como o iene japonês ou ao marco alemão.
Salman acredita, porém, que esse tipo de medida é errado. "O máximo que esses países conseguiram foram compradores desesperados, que aceitaram negociar com outras moedas", declarou. "E, ainda assim, quando o dólar reverteu a tendência e voltou a se valorizar, esses contratos foram abandonados", acrescentou.
Para o consultor, "não é nem um pouco realista sequer pensar em atrelar o petróleo a outra moeda que não seja o dólar". A principal razão, justificou, é o fato de que "o dólar é a moeda do maior importador de petróleo da Opep", os EUA. "Além disso, as moedas da maioria dos países da Opep são relacionadas, quando não atreladas diretamente, ao dólar", explicou. "E o dólar também é moeda preferida pela maior parte dos investidores e empresários em muitos países".
Na avaliação de Salman, uma forma de a Opep controlar as variações bruscas de preços provocadas pelas oscilações do dólar é mexer no preço-alvo do petróleo. A organização já estabelece uma banda de flutuação para as cotações da commodity – quando os preços caem abaixo do valor mínimo estipulado, os países-membro reduzem a produção para elevar os preços; caso contrário, aumentar o total produzido e a cotação cai. Isso, segundo o consultor, poderia levar em conta também o câmbio.
De 1973, quando ocorreu o primeiro choque do petróleo, até 2002, os preços da commodity subiram 700%, de US$ 3,05 para US$ 24,36, informou Salman no artigo. Ele ressaltou, porém, boa parte dos ganhos foi corroída pela inflação – puxada fortemente pela desvalorização do dólar. Segundo ele, em termos deflacionados, o preço do petróleo aumentou pouco mais de 100%, para US$ 6,53 no período.

