São Paulo – O sistema de cooperação é um dos maiores orgulhos para Nelsa Nespolo, fundadora da Justa Trama. A cooperativa une todos os elos do campo à venda de roupas produzidas com algodão orgânico. Em 2020, a Justa Trama completa 15 anos de existência e viu seu faturamento triplicar em meio à pandemia do coronavírus. Para Nespolo (foto acima), o momento difícil fez com que muitas pessoas buscassem alternativas mais sustentáveis e justas para os produtos que compram.
Hoje, em torno de 500 pessoas formam a Justa Trama. A cooperativa comercializa em feiras, no e-commerce falando direto com o consumidor, e através de lojas parceiras. “As vendas, como um todo, aumentaram três vezes em relação ao ano passado. Nessa situação toda, fizemos essa venda tão significativa, quer dizer que dá para ter esperanças nesse mundo que se comporta diferente”, revelou ela, que é uma das costureiras que fazem a Justa Trama.
A cooperativa se espalha nas cinco regiões do Brasil através da união de associações e cooperativas. Cada entidade é chamada de ‘elo’ e é responsável por uma parte da produção. Em Tauá, no estado do Ceará, a Associação de Desenvolvimento Educacional e Cultural (Adec) cultiva algodão agroecológico e orgânico. Ainda na produção, está a cooperativa Escola Família Agrícola da Fronteira (Aefaf), de Ponta Porã, Mato Grosso do Sul. Em Pará de Minas, Minas Gerais, é feita a fiação e tecelagem pela Coopertêxtil. Em Porto Velho, Rondônia, a Cooperativa Açaí faz, a partir dos retalhos da confecção, bonecas, botões e colagens que acompanham as coleções de roupas. Por fim, em Porto Alegre, sede da Justa Trama, a Cooperativa de Costureiras Unidas Venceremos (Univens) confecciona roupas, serigrafia, bordado e faz o tingimento, e o grupo Inovarte cria jogos e bichinhos de brinquedo com retalhos.
Comércio Justo e cultivo orgânico
Além de ter todo seu cultivo orgânico, a cooperativa tem como missão promover a economia solidária e o comércio justo. A remuneração para produtores e costureiras cooperados chega a ficar entre 30% e 50% acima do mercado. “Estamos no processo de conquistar os consumidores do orgânico, então as cooperativas têm outros plantios consorciados, e as costureiras também produzem outras coisas. Mas nosso elo é o algodão orgânico. Somos uma grande família que perpassa os estados para uma construção coletiva. O resultado é divido por igual entre todos”, conta ela sobre o lucro final dos itens.
No início, a cooperativa chegou exportar fios e peças de roupa para Itália, mas os cooperados decidiram se voltar ao mercado interno. “Percebemos que o desafio era comercializar aqui dentro. É nosso grande investimento”, explicou ela. Além de produtos que vão de lençóis, camisetas, calças, camisas, a cooperativa também produz linhas de produtos corporativos.
Para impulsionar as vendas online, eles investiram em propagandas em mídias como o rádio. A fundadora também já participou de quase 50 lives em diferentes redes sociais para contar sobre o trabalho. “Na soma desses 15 anos, percebemos o resultado vendo o quanto inspiramos novas pessoas. Temos uma venda de tecido super significativa. A consciência das pessoas cresceu muito sobre o orgânico. Muito porque teve denúncia sobre os agrotóxicos, e 25% deles, no mundo, são jogados no [plantio do] algodão”, acrescentou ela.
Sobre a cultura algodoeira, Nespolo lembra que é preciso um clima quente e seco, comum nas regiões Nordeste e Centro-Oeste do País. Já o cultivo orgânico é essencialmente de agricultura familiar. Neste ano, além da boa safra na lavoura, a Justa Trama colheu como frutos novos associados no campo. “No campo, o orgânico é o atrativo para a juventude permanecer. Nunca tivemos tantas jovens [na costura, também]”, explicou Nespolo, que trabalha há 24 anos com cooperativismo.
Para a fundadora, o bom momento dos produtos orgânicos está justamente na mão de mulheres e jovens. “A roupa é uma escolha muito sua. Quando vemos que aumenta a venda, é porque tem mais gente com consciência na forma de vestir. Eu acredito muito na juventude deste momento. Muitas vezes, conseguimos parcerias com jovens, sempre juventude e muito com mulheres”, conta ela, que acredita no encantamento que a produção sustentável causa entre os novos trabalhadores e consumidores.
Apesar do foco no mercado brasileiro, a Justa Trama pretende voltar a fornecer produtos ao mercado externo. “Aqui tem um mundo para ser construído, mas se houver possibilidade, estamos abertos [a exportações]. Além irmos a eventos na América Latina e Europa, para falar que dá para trabalhar de forma coletiva, e que tem espaço para se desenvolver, lógico que queremos também que nosso produto chegue para mais pessoas lá fora”, concluiu Nespolo, que costuma palestrar em eventos no exterior. “Sentimos falta de eventos presenciais porque pregamos muito o coletivo. Trabalhamos com emoção. Poder se ver e confrontar ideias. Queremos muito que passe a pandemia, estamos loucos para ir às feiras e mostrar esses produtos ao vivo”, declarou a fundadora da Justa Trama.