São Paulo – A evolução das importações de alimentos dos países árabes é anualmente ampliada por datas e celebrações como a que começou nesta semana, o Ramadã, mês sagrado para os muçulmanos. Durante o período, os muçulmanos fazem jejum durante o dia e grandes banquetes após o pôr do sol. Por isso, nos meses que o precedem, é comum que os países com maioria muçulmana engordem seus estoques, principalmente de alimentos. Durante a pandemia de covid-19, a tendência de crescimento da curva de compra destes países se manteve, mas foram enviados menos produtos com certificação halal para várias regiões do mundo.
Segundo o vice-presidente da Federação das Associações Muçulmanas no Brasil (Fambras), Ali Zoghbi, a demanda por alimentos costuma crescer de 30 a 40 dias antes do início do Ramadã. Em março de 2020, os embarques de alimentos e bebidas do Brasil aos países árabes somaram 968,44 mil toneladas, 11,52% a mais do que no mês anterior. Já as vendas brasileiras dos mesmos produtos aos países islâmicos, que incluem os árabes, foram de 2,28 milhões toneladas em março, montante 4,89% maior do que em fevereiro.
Apesar da demanda por alimentos como um todo estar mantida, foi nas certificações halal que a mudança chamou atenção. “Para produtos industrializados exportados aos países árabes o volume se manteve estável (desde o começo do ano até agora), comparado com o primeiro quadrimestre de 2019. Já nas emissões de certificado halal no segmento de proteínas animais no geral houve queda”, apontou Dib Ahmad El Tarrass, gestor de Desenvolvimento do Halal Industrial da Fambras Halal.
A queda, no comparativo das emissões feitas no primeiro quadrimestre de 2020 (até o momento) frente ao mesmo período de 2019, se dá em diversos países. Entre os árabes, houve média de recuo de 5% na emissão de certificados halal, com exceção dos Emirados, que se manteve estável. Já aos asiáticos, foram emitidos menos 5% certificados, com exceção da China, que teve aumento de 10%. Em países europeus como Alemanha, Bélgica e Itália, em média houve queda 10%, enquanto a Holanda ficou estável. Aos países africanos a média de queda foi de 5% na emissão de certificados halal, com exceção da África do Sul, que se manteve estável.
A pandemia de covid-19, que vem avançando pelo mundo nos últimos quatro meses, é apontada como fator que influenciou a comercialização. “Para o setor de proteínas, sim foi um fator negativo que gerou inseguranças”, explica Dib. As exportações de produtos industrializados para os países árabes nos meses que antecedem o Ramadã chegam a ser 30% a mais no volume exportado, comparados com meses normais. O abastecimento ocorre em média 60 dias antes.
O adiamento de eventos de promoção dos produtos é um dos desafios que o setor halal está enfrentando nessa época de pandemia de covid-19. “Com o cancelamento de feiras internacionais do segmento alimentar, possivelmente para todo ano de 2020, nossas indústrias deverão buscar alternativas como, por exemplo, fortalecer os laços comerciais com clientes atuais criando mecanismos conjuntos para manter o crescimento. Deverão buscar desenvolver planos de contingência e de redução de riscos na cadeia de suprimentos. Essas ações são fundamentais para o equilíbrio comercial das indústrias brasileiras”, apontou Dib.
Ainda no segmento halal, os dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) corroboram a análise de Dib. “Houve retração pontual na importação de alguns mercados de produtos halal, ao passo que outros mantiveram ou até mesmo incrementaram o volume de vendas. É um movimento natural, já que o próprio Ramadã teve uma dinâmica diferente em 2020, decorrente das determinações de isolamento nas diversas nações frente à epidemia da covid-19”, informou a entidade em nota. Para os próximos meses, a expectativa da ABPA é de estabilidade. “Esperamos que as exportações se mantenham nos atuais patamares”.
Se as compras pré-Ramadã costumam crescer, durante o período do Ramadã ocorre o movimento contrário, pelo fato dos países já terem estoque formado. Mesmo assim, Dib acredita que neste ano as vendas a essas nações devem seguir firmes. “Nossa visão é otimista. Acreditamos que não ocorrerá queda brusca, o que ocorrerá são adequações relativas a uma gestão comercial mais eficiente e segura”, explica.
Ali Zoghbi lembra que no Brasil as indústrias seguem produzindo alimentos para abastecer a demanda externa. “As linhas de produção, principalmente o halal, permanecem sem queda, com certa normalidade para esse período. É a maneira como estamos observando. Estamos acompanhando, claro, dia após dia e temos percebido que se manteve o fluxo de pedidos. Nossa produção permanece a mesma. Temos feito os abates de proteína animal”, declarou.
Alguns países árabes têm monitorado o abastecimento local para garantir que tenham alimentos para o mês sagrado. Segundo a agência oficial dos Emirados, a WAM, o porta-voz do Conselho de Segurança Alimentar do país, Essa Al Hashemi, afirmou, nesta quarta-feira (22), que “apesar das circunstâncias excepcionais que os Emirados Árabes Unidos e o mundo estão enfrentando, o valor e o volume de nossas importações e exportações de alimentos e bebidas permanecem os mesmos como no ano passado”.
Ainda segundo ele, o volume total de alimentos importados durante o primeiro trimestre de 2020 foi de 3,5 milhões de toneladas, enquanto as exportações de alimentos atingiram 918 mil toneladas. As reexportações de alimentos representaram 455 mil toneladas.