São Paulo – O brasileiro Felipe Kaizer (foto acima) cresceu em uma família que valorizava o ato de cozinhar. O que ele não sabia é que resgataria a origem desse gosto e faria dela a base de sua especialização como chef de cozinha. Uma das avós de Felipe, Emilia Kaizer, nasceu no Cairo, capital egípcia, e de lá vieram receitas e influências que compartilharia com o neto.
Ainda jovem, aos 18 anos, Emilia migrou com sua família do Egito para o Brasil. Ela, que falava apenas francês, trouxe elementos da cultura e da língua árabe através da culinária. “Os pratos, como o hommus, que significa grão de bico, permaneceram na língua árabe. Minha avó cozinha muito e eu falava um pouco com ela sobre as receitas, almoçava muito na casa dela. Ela fazia kafta, saladas com trigo e ervas. A irmã da minha avó, Mirela, cozinhava super bem mesmo. E os pais da minha avó, inclusive o pai dela também, o que é curioso porque isso era menos esperado de um homem”, contou Felipe.
Mas foi o tempo que morou em Israel que ajudou o chef a conhecer mais sobre a culinária do Oriente Médio. “Foi quando percebi que precisava valorizar isso, que é da minha família”, destacou ele. Lá, ele mergulhou em receitas de restaurantes e mesmo de famílias e descobriu pratos da Argélia, Marrocos, Tunísia e até do Iêmen. “Pesquisei ativamente e aproveitei essa mistura, com pitadas de vários países”, revelou.
Comida egípcia brasileira
Na volta ao Brasil, inspirado pela experiência com suas origens, Felipe decidiu deixar as cozinhas de restaurantes e se tornar personal chef, partilhando ensinamentos em aulas particulares. Outra frente de trabalho dele são buffets e jantares, em especial aqueles com temática egípcia e árabe.
Um dos locais em que ele teve agenda neste ano foi o Andar 43. O local abrigava uma antiga sala comercial no penúltimo andar do Mirante do Vale. O prédio fica em frente ao Vale do Anhangabaú, na capital paulista, e o novo dono, claro, aproveitou a vista. Mas não só. Hoje o ambiente foi transformado em uma pequena selva urbana, com plantas nativas e móveis antigos. Lá, acontecem eventos especiais, como o jantar egípcio brasileiro assinado por Felipe Kaizer em setembro deste ano.
O menu evidenciou a culinária do país do Norte da África, mas propôs o uso de ingredientes brasileiros nos pratos. “No caso do hommus, fiz a troca o grão de bico pelo feijão manteiguinha, também teve babaganuche de jiló, entre outros. Minha avó, inclusive, foi no primeiro jantar. O feedback das pessoas está sendo superbom”, detalhou Felipe. “Eu gosto muito de trabalhar com peixes e fruto do mar e comecei a buscar receitas dentro do mundo árabe que abordassem esses ingredientes. Então, é um outro recorte”, pontuou ele sobre como tem ampliado suas criações.
Os ingredientes que têm na dispensa, o chef conta que em geral são de fácil acesso no Brasil. Há, no entanto, os que ele prefere trazer de viagens internacionais, como o zaatar e páprica marroquina que usou recentemente, e aqueles que considera mais difíceis de encontrar, como a própria folha de uva, que usa nos charutinhos. “Apesar de ser muito usado em restaurantes árabes locais, eu tive muita dificuldade de encontrar as folhas na qualidade que queria. E a folha de molokhia, usada em uma sopa tipicamente egípcia, também é difícil achar, quase não faço. Já outras coisas, como a água de rosas, a de laranjeira e o próprio cominho, são mais fáceis. Aliás, a base da comida egípcia é cominho, com certeza”, declarou o chef.
Outros cardápios que fez no Andar 43 também tiveram como tema a culinária árabe como um todo e até um ingrediente brasileiro: a mandioca. “A ideia é fazer mais brunchs lá. Sou especializado e quero trabalhar com comida do Oriente Médio, e o peixe. Mas se a pessoa pede um cardápio diferente, eu sempre dou um jeito de dar um toque árabe. É uma marca minha. Eu faço questão de explicar os pratos que estão com nomes em árabe. Conto da origem e temos essa troca. Recentemente, um rapaz da Argélia foi em um dos eventos e disse que a comida estava igualzinha à do país dele, muito legítima!”, comemora o chef.
Em sua conta no Instagram @cheffkd Felipe mostra mais sobre o trabalho e o dia a dia na procura de ingredientes para criar seus pratos. Nos eventos, ele conta com apoio de uma equipe, que varia dependendo do tamanho do pedido. “Consigo trabalhar muito a criatividade. Gosto de conhecer pessoas novas e estar em ambientes diferentes. Tenho minha fiel escudeira Rana, que já fez brunchs com tema nordestino no Andar 43, inclusive. E tenho outras pessoas que ajudam, como garçom, na cozinha e limpeza”, contou.
Mas para além do trabalho criativo, a produção de banquetes inclui tarefas como fazer as compras, o atendimento, o orçamento. “Está crescendo. A ideia é ter um espaço próprio no ano que vem. Preciso me valorizar e valorizar as pessoas que trabalham comigo, porque fazer pratos árabes é prazeroso, mas também é muito trabalhoso”, concluiu o chef.