Marco Bahé, enviado especial
Vale do São Francisco – A opção pela fruticultura irrigada se mostrou uma excelente escolha para a região do Vale do São Francisco. E não só pelas receitas geradas aos produtores, mas também pela geração de empregos. Estudos da extinta Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e da Assessoria Legislativa da Câmara Federal mostram que esta modalidade é a que apresenta menor dispêndio por emprego gerado, se comparado com outros setores da economia.
Um hectare de terra irrigado no Vale do São Francisco custa hoje, em média, US$ 10 mil para o Poder Público. Se o plantio for de uva, serão necessárias cinco pessoas por hectare, o que dá um custo de US$ 2 mil por emprego gerado. A indústria automobilística, por exemplo, consome no mínimo US$ 47,4 mil por emprego gerado; a farmacêutica, US$ 42,4 mil; a petroquímica, US$ 38,6 mil; e a siderurgia, pelo menos US$ 15,6 mil.
Além da geração de emprego a um custo barato, a fruticultura irrigada apresenta conseqüências positivas no aspecto social. Um dos mais óbvios deles é a fixação do homem no campo. Estima-se que hajam 400 mil trabalhadores empregados na agricultura irrigada do Vale do São Francisco. Em outra situação, esse contingente já teria migrado para as capitais nordestinas ou cidades do Sudeste brasileiro.
Uma massa assalariada tão grande gerou também um sindicalismo bastante organizado. Atualmente existem na região 10 sindicatos com atuação nos municípios envolvidos na agricultura irrigada. Unidos, eles conquistaram benefícios sociais não muito comuns no interior do Nordeste. “Aqui, quase a totalidade dos trabalhadores regulares tem carteira assinada. O transporte é gratuito e seguro, feito em ônibus. Ninguém pode ser transportado na carroceria de caminhões. Nas fazendas, há vestiário masculino e feminino e todos possuem equipamentos de proteção individual”, relata o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolina, Manoel Moreira.
Agricultores
A pujança da fruticultura no Vale do São Francisco também fez nascer uma classe média rural significativa. Cálculos produzidos pela Vale Export, cooperativa de produtores da região, dão conta que um pequeno agricultor, que explore 6 hectares de uva, pode chegar a um faturamento anual de R$ 300 mil. Estimando-se um rentabilidade de 30%, este agricultor teria uma renda mensal de R$ 8 mil, o que é bem significativo para a região.
Tal classe média acaba por impor uma demanda por produtos e serviços mais qualificados. Os efeitos disso são vistos a olhos nus no centro financeiro do Vale: as cidades irmãs de Petrolina e Juazeiro. A primeira localizada em Pernambuco e a segunda, na Bahia, são separadas apenas pelo Rio São Francisco, obstáculo que uma ponte já resolveu há 50 anos.
Um dos setores mais aquecidos no local é o da construção civil. Edifícios luxuosos começam a ser erguidos na orla fluvial petrolinense, uma espécie de avenida Copacabana sertaneja. Um deles, o Morada do Rio, possui apartamentos de 250 metros quadrados e elevador panorâmico. “Temos mais facilidade em comercializar unidades com padrão A ou B. O público alvo são agricultores, funcionários públicos graduados e a classe médica”, detalha Audísio Venâncio, diretor da Construtora Venâncio, uma das cinco maiores do Vale.
O depoimento do construtor revela um outro segmento em franca expansão no Vale. Petrolina e Juazeiro têm se configurado num significativo pólo médico interiorano, com clínicas especializadas e hospitais se multiplicando a cada ano. Serviços como tomografia computadorizada ou intervenções complexas como transplante de órgãos são realidade naquela parte do sertão. Medicina será uma das graduações da Universidade Federal do São Francisco, instituição já oficializada em Diário Oficial e cujas instalações físicas estão em construção.
Califórnia
O prefeito de Petrolina, Fernando Bezerra Coelho, compara a experiência do Vale do São Francisco com o que ocorreu na Califórnia, nos Estados Unidos. “Com o fim do ciclo do ouro, na década de 30, a Califórnia se tornou a unidade mais pobre da federação norte-americana. Fez-se, então, um investimento fortíssimo em irrigação. Logo depois, vieram as universidades e, com elas, a tecnologia. Hoje, a Califórnia figura entre os mais ricos estados americanos”, diz o prefeito.
Apesar dos evidentes benefícios, o Brasil ainda investe timidamente em agricultura irrigada. No país, há 2,9 milhões de hectares irrigados, o que corresponde a 6,4% da superfície total cultivada de 45 milhões de hectares. Estima-se que o potencial irrigável ultrapasse os 30 milhões de hectares, o que poderia duplicar a produção agrícola nacional.
Segundo o International Management Institute, órgão que assessora a FAO, países como o México já estão em situação muito mais avançada do que a nossa no que diz respeito ao aproveitamento de solo irrigável. Lá, um projeto de irrigação público elevou de 200 mil hectares para 8,3 milhões de hectares a área irrigada. Isto em pouco mais de 50 anos.
Os dois países mais populosos do planeta na atualidade, a China e a Índia, investem maciçamente em irrigação por causa de sua capacidade inigualável de criação de empregos no campo, motivo pelo qual conseguem manter mais de 80% de sua população fora das áreas urbanas. A China possui a maior área irrigada do mundo, com 50 milhões de hectares, e lançou um programa ambicioso que pretende irrigar 1 milhão de hectares por ano.