Giuliana Napolitano
São Paulo – O principal assunto do encontro entre Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente dos Emirados Árabes Unidos, xeque Zayed bin Sultan Al Nahayan, será o setor de petróleo. Mas, ao contrário do que se poderia supor, não é o Brasil que está na posição de comprador. São os Emirados, um dos maiores produtores mundiais da commodity, que estão atrás do petróleo brasileiro.
"A indústria petrolífera do Brasil passa a ter maior importância mundial", afirmou o embaixador brasileiro nos Emirados, Flávio Moreira Sapha, em entrevista à ANBA, de Abu Dhabi, capital do país.
A razão da mudança, disse o diplomata, é o aumento da demanda pelo petróleo produzido no Brasil. O país produz o óleo pesado, que foi considerado de baixa qualidade durante muito tempo. "Bom era o petróleo leve, como o dos países árabes, usado como combustível", explicou. "Mas agora está havendo uma transformação ambiental. Olhe ao redor: a humanidade está substituindo vidro, ferro, por plástico. E, para fazer plástico, é preciso petróleo pesado".
O embaixador lembrou que o Golfo Arábico é o "eixo de petróleo do mundo". Apenas quatro países da região – Arábia Saudita, Kuwait, Catar e Emirados – concentram quase a metade das reservas mundiais. "Mas produzem apenas petróleo leve. Para comprar o petróleo pesado, o melhor preço é o brasileiro", declarou.
Petrobras
Os Emirados sabem disso e vêm aumentando a importação de petróleo brasileiro. Entre 2001 e 2002, as vendas mais do triplicaram: passaram de cerca de US$ 100 milhões para US$ 330 milhões, metade de tudo o que foi exportado pelo Brasil a esse país árabe no período. Para este ano, a expectativa é de que os embarques de petróleo cheguem a US$ 400 milhões, segundo Sapha. E pode haver ainda mais crescimento no futuro, dependendo dos resultados da visita de Lula e empresários à região.
Acompanha a comitiva oficial o presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra. Segundo Sapha, nos Emirados, Dutra tem encontros agendados com representantes das duas maiores estatais petrolíferas do país, a Abu Dhabi National Oil Company (Adnoc) e a Emirates National Oil Company (Enoc). "Os resultados desses encontros serão vistos nos números (de negócios) de 2004", declarou.
Investimentos no Brasil
O embaixador disse ainda que empresários dos Emirados têm interesse em investir em refino e distribuição de petróleo do Brasil. "Eles já têm grandes investimentos em vários outros países, como a França, os Estados Unidos, a Holanda e os asiáticos", informou. "E poderiam fazer, por exemplo, uma joint venture com a Petrobras".
Esse tipo de parceria também está nos planos do governo brasileiro. Em entrevista exclusiva a jornalistas árabes e à ANBA nesta semana em Brasília, antes de embarcar para o Oriente Médio, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, afirmou que um dos objetivos da viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos países árabes é o de divulgar as oportunidades de investimentos no Brasil. Ele citou especificamente as áreas de petroquímica e energia como "áreas de interesse" para os árabes.
Flávio Sapha lembrou que, desde os atentados terroristas de 11 de setembro, os árabes "têm muito dinheiro disponível para investir". "Aumentou muito o controle sobre os investimentos e depósitos de árabes nos EUA, então esses recursos foram tirados de lá e agora é o momento ideal para outros candidatos", declarou. "Mas a captação desses recursos depende de projetos, de garantias. Não é um direcionamento automático", ponderou.
Além disso, afirmou o embaixador, no caso dos Emirados, esses investimentos devem se concentrar quase que exclusivamente no setor petrolífero. Apesar da diversificação econômica que vem ocorrendo nos últimos anos, ressaltou, "toda a estrutura do país está montada em cima do petróleo". "E a própria diversificação da economia depende dessa indústria".
História
Os Emirados Árabes são hoje a principal porta de entrada de mercadorias para o Oriente Médio, e o país também funciona como pólo reexportador para a Ásia e o Leste Europeu. As operações estão concentradas em Dubai, cidade que se tornou referência econômica na região.
Segundo Flávio Sapha, os Emirados começaram a se firmar como centro comercial após a crise do Canal de Suez, que fica no Egito e liga o Mar Mediterrâneo ao Mar Vermelho. O canal foi alvo de disputas entre o Egito e Israel desde 1948 e chegou a ser interditado pelo país árabe em 1967. Só foi reaberto quase 10 anos depois e, hoje, por ser muito estreito, não comporta a navegação de alguns petroleiros.
"Assim, o comércio se desviou para Dubai", afirmou o embaixador. Isso porque a cidade tem uma localização geográfica privilegiada: faz fronteira com a Arábia Saudita e Omã e tem saída para o mar próxima ao estreito de Hormuz, que é o principal ponto de escoamento da produção de petróleo do Oriente Médio para o Mar da Arábia e o Oceano Índico.
Para aproveitar a geografia favorável, Dubai começou a desenvolver os setores portuários e de serviços e hoje se tornou o maior centro comercial e reexportador da região. O porto de Jebel Ali, por exemplo, é comparável ao de Amsterdã e o de Cingapura, que estão entre os mais movimentados do mundo.
Recentemente, Dubai também passou a fazer parte do calendário de eventos mundiais. Em setembro, foi a primeira cidade árabe a sediar uma reunião anual do FMI e do Banco Mundial. Neste mês, está recebendo os jogadores de futebol de seleções sub-20 para a realização do campeonato mundial da categoria.
E, entre 7 e 9 de dezembro, sedia a Semana do Brasil, maior evento de negócios brasileiro no mundo árabe, organizado pela Agência de Promoção de Exportações do Brasil (Apex) e pela Câmara de Comércio Árabe-Brasileira (CCAB).
Flávio Sapha, aliás, fez questão de salientar o "trabalho pioneiro, exaustivo e desbravador de abertura de canais de negócios nos países árabes" feito pela CCAB. "Todos os anos, a Câmara tem trazido entre 40 e 50 empresários para a região, para conhecer as empresas locais e fazer comércio. É uma iniciativa extremamente significativa e importante, que continua agora com a visita de Lula e a Semana em Dubai", concluiu.

