São Paulo – Assim como ocorre no Natal nos países cristãos, nas nações de populações muçulmanas o encerramento do Ramadã é tempo de consumo aquecido. Chamada de Eid al-Fitr, a data é festiva para os seguidores do Islã. Nos dias prévios, as lojas ficam abertas até tarde para atender a demanda, principalmente de alimentos, roupas e presentes, o que representa uma oportunidade para os fornecedores dos países islâmicos, tais como os árabes.
O Ramadã é um período religioso em que os muçulmanos fazem muitas orações e jejuam do nascer ao pôr do sol. Ele ocorre no nono mês do calendário islâmico e, assim como seu início, o término é definido pela lua, ocorre quando a lua nova aparece após 29 ou 30 dias. Neste ano, o jejum termina na quarta (12) e a festa do Eid será na quinta (13).
Muitas empresas internacionais fornecedoras dos mercados muçulmanos conhecem o aumento no consumo de alimentos que ocorre no Ramadã e no final dele, já que o jejum é quebrado com alimentação farta e coletiva, mas nem todos sabem que também existe um aquecimento das compras em outros setores, como de confecção, calçados e brinquedos. É tradição entre os muçulmanos presentear as crianças e usar roupas novas no Eid al-Fitr.
O diretor-executivo da certificadora de produtos halal Cdial Halal, Ali Saifi, acredita que as empresas brasileiras não estão cientes desse mercado gerado pela festa do Eid al-Fitr e que há espaço a ser buscado nos países árabes na data. “É como se fosse o período de Natal ou de Páscoa para os cristãos, além da confraternização, nós presenteamos as crianças, para que elas fiquem felizes”, conta Saifi, ele mesmo um muçulmano.
O agrado aos pequenos chega tanto em forma de presente, especialmente brinquedos, quanto em dinheiro. Nesse último caso, as crianças mesmo fazem suas escolhas de compras. O empresário egípcio Mohammed Darwich, que vive no Brasil, conta que no seu país presentear as crianças com dinheiro é tradição. “As famílias se visitam e os tios dão dinheiro para as crianças comprarem um brinquedo ou alguma coisa que gostem”, diz.
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Na infância de Darwich, no Egito, esses presentes eram muito aguardados por ele e seus irmãos. “A gente esperava, fazia as contas, ‘tio tal vai me dar tanto, meu avô vai me dar tanto’, diz. As compras eram de brinquedos da época e, às vezes, o dinheiro era reunido entre irmãos e recebia aporte do pai para a compra de algo maior, como um cartucho de videogame. “Hoje as crianças devem comprar celular”, especula Darwich, que agora dá dinheiro a sobrinhos no dia. As crianças também recebem presentes, normalmente brinquedos, nas mesquitas.
Roupa nova
Outro movimento de compras da data ocorre no setor de roupas e calçados, já que os muçulmanos vivem o Eid al-Fitr como um dos momentos mais especiais do ano e, por isso se vestem bem e se perfumam para ir à mesquita ou confraternizar. O diretor-executivo da Cdial Halal relata que está nos ensinamentos islâmicos que neste dia é preciso escolher a melhor roupa que a pessoa tem. “É um dia especial para nós”, afirma Saifi.
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“A gente tem o costume de chegar no dia do Eid com roupas novas”, conta o egípcio Darwich. Ele relata que no Egito as lojas vendem muito nesse período e as pessoas de menor renda, inclusive, recebem roupas como presentes para passar o dia. “Os comerciantes fazem o estoque antes do Ramadã para venderem essas roupas até o final do Ramadã. Na noite antes do Eid é quando os comerciantes mais faturam porque todo mundo sai comprando”, diz.
A muçulmana Fatima Adel Khatib mora em Guaíra, no interior paulista, e também presencia as compras de roupas e calçados novos pelos muçulmanos para usar no Eid al-Fitr. Apesar de não ter muitas crianças no seu dia a dia, ela observa que entre os muçulmanos os presentes são mais voltados às crianças, que recebem inclusive dinheiro. Mas alguns familiares e amigos também trocam presentes quando se visitam. “Aqui, às vezes a gente troca presentes”, conta.
Nas lojas e shopping centers dos países árabes, o Eid é um tempo no qual são anunciadas muitas promoções, ofertas e sorteios voltados para os consumidores. O objetivo dos varejistas é liquidar os estoques feitos para o período do Ramadã. Neste ano, em função do aumento das compras online, as promoções e ofertas também migraram para o comércio eletrônico, segundo notícias publicadas em agências de notícias árabes. Apesar de haver setores de maior demanda, as compras são de todo tipo de produto.
Tempo de orar, ajudar e fazer feliz
Para os seguidores do Islã, a troca de presentes e o uso do vestuário novo no Eid al-Fitr têm um sentido profundo e muito além do consumo. “O profeta (Mohammed) manda aproveitar esse dia, ensina a se divertir nesse dia, ter um dia legal com seus amigos, com seus parentes, seus filhos, então nada mais importante do que você agradar as crianças, esse dia é para que as crianças sejam felizes, elas precisam saber que esse é um dia especial”, diz Ali Saifi.
Para os adultos o dia se torna agradável com confraternizações, as orações e encontros nas mesquitas, a visita à casa de amigos e familiares para refeições conjuntas. “Todas as casas têm comida, uns saem visitando as casas dos outros”, conta Saifi. Neste ano, isso deve ser mais restrito em função da pandemia de covid-19.
O egípcio Darwich entende as ações do Eid, inclusive os presentes, como uma forma de fazer as pessoas felizes. “Para mim se o Eid é tratado como um dia normal, eu fico triste. Não tem que ser um dia normal, tem que ser um dia de festa, de alegria, um dia muito bom, é isso que a religião diz, tem que ser uma festa”, afirma Darwich. Ele conta que é dia de ajudar quem não tem condições e de fazer companhia para um parente que tenha perdido alguém próximo.
O Eid al-Fitr
Fatima conta sobre como entende o significado do Eid al Fitr. “Nós muçulmanos jejuamos 29 ou 30 dias no Ramadã. A gente se abstém não só de comida e bebida, mas também de conversa fiada, de discussão, de palavras obscenas. Nós nos conectamos mais com Deus, aumentamos os atos de adoração, as orações noturnas, fazemos mais súplicas, fazemos mais caridade. A gente celebra o fim desses dias como um agradecimento a Deus por ele permitir termos sido capazes de concluir mais um mês de Ramada”, afirma ela, que é professora.
O período do Ramadã é marcado pelo aumento das ações de caridades e solidariedade dos muçulmanos para com as pessoas mais carentes e isso ocorre – e é intensificado, inclusive – no final desse tempo, no Eid al-Fitr. “A gente tem que dar o desjejum para algum muçulmano pobre para que todos os muçulmanos possam comemorar o Eid. Pode ser em comida ou alguma quantia”, relata Fatima.