São Paulo – Um sobrenome árabe está entre os cinco escritores brasileiros mais lembrados no mundo acadêmico internacional. É Hatoum, de Milton Hatoum. Autor de livros traduzidos em, pelo menos, 15 países, o escritor brasileiro descendente de libaneses aparece ao lado de outros grandes nomes da literatura nacional, como Machado de Assis, Clarice Lispector, Jorge Amado e Guimarães Rosa. O trabalho foi divulgado ontem (30) e hoje (01), no Rio de Janeiro, durante a segunda edição do Conexões Itaú Cultural: Encontro Internacional de Literatura Brasileira.
Para a pesquisa, coordenada por Claudiney Ferreira e Felipe José Lindoso, foram enviados mais de mil questionários a professores, tradutores e pesquisadores que trabalham com literatura no mundo. Os primeiros resultados, coletados com cerca de 100 entrevistados, 10% do total, começaram a chegar. E surpreenderam os investigadores. “Identificamos um grande número de profissionais no exterior que trabalham com literatura brasileira”, afirma Ferreira. “É um mercado de trabalho potencial e uma oportunidade para se trabalhar melhor a literatura nacional no exterior”, completa.
Outra surpresa da lista foi o nome de Hatoum, Chico Buarque, Moacyr Scliar figurarem entre os 10 autores mais citados pelos estudiosos. Segundo o pesquisador, isso mostra que existe uma mudança no segmento, principalmente por conta da velocidade da informação, resultado do advento da internet no mundo moderno. De acordo com Ferreira, o que era comum, até um tempo atrás, era um autor brasileiro demorar até 30 anos para ser conhecido (e reconhecido). Agora isso mudou. Paulo Coelho aparece em 14º no ranking, mas, segundo Ferreira, ele não entra nessa conta, por não se ter, no mundo, a percepção de que ele é um autor brasileiro.
Prova concreta da mudança na percepção da literatura brasileira são os livros de Hatoum, que foram traduzidos para várias línguas num curto espaço de tempo após o lançamento do Brasil. A tradução mais recente está saindo agora do forno – e é em chinês. “Manuel Bandeira dizia que ser traduzido era uma delícia. E eu concordo. É muito bacana saber que você está sendo contado em outras línguas, até mesmo algumas que você não domina”, diz o autor, que, além de chinês, também foi traduzido no Leste Europeu, em croata, por exemplo.
Para essas traduções, específicas, Hatoum diz que o segredo é ter um profissional de qualidade, trocar sempre informações, fazer se conhecer para garantir o bom resultado do trabalho. “Troco e-mails os tradutores, conversamos muito. O de chinês, por exemplo, escreve muito bem em português. Isso facilita o trabalho”, diz. Em árabe, Hatoum tem traduzido, até agora, o romance Dois Irmãos, no Líbano. Foi em 2002 pela editora Dar Al Farabi, com tradução de Safa Jubran.
Política cultural
Segundo Ferreira, além de jogar um pouco de luz no segmento – o último trabalho desse tipo data dos anos 70 -, a pesquisa pode servir de suporte ao governo para identificar ações mais eficientes de promoção da literatura brasileira no exterior. “As ações são muito insignificantes”, afirma Ferreira. De acordo com ele, a literatura brasileira pode ajudar muito o país nesse momento de euforia econômica, pois é uma ferramenta de divulgação cultural sem precedentes. Países fortes têm grandes nomes cravados na literatura mundial.
E aí, novamente, entra a importância do fomento à tradução dos autores brasileiros, por meio de programas governamentais, por exemplo. “A pesquisa mostrou, por exemplo, que o português, falado em poucos países, é um impeditivo ao acesso à literatura nacional”, diz Ferreira. De acordo com o pesquisador, à medida que os resultados forem coletados e novos dados surgirem, o trabalho será divulgado à imprensa. "A intenção é chamar para o debate sobre a literatura brasileira e propor ações e soluçoes", conclui Ferreira.