Giuliana Napolitano
São Paulo – O governo federal está disposto a apoiar a internacionalização das empresas brasileiras. Além das declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva – que vem dizendo nos últimos meses que os empresários precisam “perder o medo” e transformar suas companhias em multinacionais –, a meta também faz parte das diretrizes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A instituição deve criar, ainda no início de 2004 uma linha de crédito para financiar firmas que queiram se instalar no exterior. Para analistas ouvidos pela ANBA, o governo vai na direção certa. “Esse apoio é importante”, afirma o diretor executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Julio Sérgio Gomes de Almeida.
Por enquanto, porém, a iniciativa ainda está no começo. Não foram concluídos os estudos de metas que se pretende atingir com o programa; também não há pesquisas sobre as empresas brasileiras que já atuam no exterior. As estimativas partem de entidades privadas. Segundo o diretor da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, cerca de 500 companhias nacionais possuem hoje algum tipo de representação fora do país – estão incluídos aí os escritórios comerciais que muitas formas usam para distribuir seus produtos no mercado externo. Isso corresponde a 0,01% do total de empresas em funcionamento no Brasil hoje e a menos de 3% daquelas que exportam.
O número de companhias capaz de produzir no exterior, porém, é ainda menor: Castro calcula que estejam em torno de 30. Fazem parte desse grupo seleto gigantes como Petrobrás, Embraer, Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Gerdau e Marcopolo. “Poucas tomam a iniciativa de se fixar lá fora”, diz o especialista.
Primeiro grau incompleto
Para Almeida e Castro, a baixa internacionalização é fruto de falta de uma tradição exportadora no país. Para se ter uma idéia, existem hoje no Brasil cerca de 4 milhões de empresas. Dessas, apenas 17 mil exportam, ou seja, 0,4% do total. “Os números são muito baixos. Isso mostra que as empresas não se sentem seguras nem para exportar, quanto mais para abrir filiais no exterior”, avalia o diretor da AEB.
Gomes de Almeida lembra que uma das formas mais comuns de internacionalização é aquela que é puxada pelas exportações. “Normalmente, uma empresa madura no comércio exterior caminha para a abertura de filiais fora”, explica. Castro concorda: “Exportação seria o primeiro grau das companhias no mercado externo; ter um escritório comercial fora, o segundo grau. Manter uma fábrica funcionando no exterior é como se fosse a faculdade. Hoje, não temos nem o primeiro grau completo”.
Segundo o diretor do Iedi, outras razões que levam companhias a se internacionalizar são a busca de recurso naturais ou minerais em outros países e a superioridade tecnológica – este último, é o caso dos países asiáticos. E nenhuma das duas hipóteses se aplica ao Brasil. “Na fase em que o país está, o processo de internacionalização está colado 99% às exportações”, diz Almeida.
Fixação da marca e exportação cativa
Uma das principais vantagens de se abrir uma fábrica ou um escritório comercial no exterior é facilitar as vendas de seus produtos. “Você contribui para fixar sua marca lá fora”, afirma Almeida. “Além disso, pode gerar uma exportação cativa”, acrescenta Castro. Isso ocorre quando, por exemplo, uma empresa do país de origem fornece matéria-prima à outra no exterior.
Ainda assim, existem críticos à idéia de internacionalização. O próprio diretor do Iedi é um deles. “É preciso tomar cuidado para não levar os empregos do país”, defende ele, argumentando que a abertura de multinacionais só gera empregos fora do Brasil. Augusto de Castro discorda. Para ele, apoiar a internacionalização é fundamental.
O analista da AEB lembra que, no passado, o governo já teve programas mais abrangentes nessa área. Na década de 80, por exemplo, existia o Fundo de Financiamento às Exportações (Finex), que apoiava a abertura de filiais no exterior. “E sem limite de valor”, ressaltou. Hoje, segundo ele, o BNDES fixa um teto de US$ 500 mil por ano para esse tipo de crédito.
Mundialmente, a tendência também é de maior internacionalização. De acordo com um relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad, na sigla em inglês) entre 1995 e 2001, o estoque de investimentos diretos estrangeiros dos países desenvolvidos aumentou 123%, para US$ 5,8 trilhões. No caso dos países em desenvolvimento, o crescimento foi de 188%, para US$ 800 bilhões.
Comparação internacional
O Brasil acumula um total de US$ 53,2 bilhões investidos no exterior, segundo a Unctad. É o maior volume entre todos os países latono-americanos. A Argentina, por exemplo, mantém US$ 19,4 bilhões no exterior; o Chile, US$ 13,4 bilhões; e o México, 12,4 bilhões.
Entre os países em desenvolvimento, o Brasil perde para os asiáticos. O campeão é Hong Kong, que tem um estoque de US$ 370,3 bilhões em estoque de investimentos estrangeiros em outros países. Em segundo lugar na Ásia, aparece Cingapura, com US$ 71,3 bilhões, seguida por Taiwan (US$ 59,6 bilhões), Coréia do Sul (US$ 43,5 bilhões) e China (US$ 35,5 bilhões).
Paraísos fiscais
Um relatório da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transacionais e da Globalização Econômica (Sobeet) mostra que, no caso brasileiro, mais da metade dos recursos investida fora do país é direcionada a paraísos fiscais, como as Ilhas Cayman e as Ilhas Bahamas. “(Isso) traduz a estratégia empresarial de efetuar investimentos no resto do mundo valendo-se de holdings sediadas em paraísos fiscais”, diz o texto.
A preocupação com tributos e tarifas, aliás, é outro motivo que pode levar à internacionalização, conclui Almeida. A CSN, por exemplo, para escapar das barreiras alfandegárias impostas pelo mercado norte-americano aos produtos siderúrgicos importados, abriu uma fábrica nos Estados Unidos.
De acordo com dados do Banco Central, depois dos paraísos fiscais, os países que mais recebem recursos do Brasil são Estados Unidos, Argentina, Espanha e Portugal.

