São Paulo – O consumidor muçulmano está mais conectado, usa plataformas de e-commerce e redes sociais para comprar, quer ter confiança e saber a origem dos produtos, com rastreabilidade e transparência, e o halal deixou de estar resumido a regiões de maioria muçulmana. Esses foram apenas alguns apontamentos da nova pesquisa sobre tendências de consumo ético e halal, apresentada pela diretora da H2R Pesquisas Avançadas, Alessandra Frisso, durante o fórum de negócios Global Halal Brazil, que terminou nesta quarta-feira (08).
“Em um mundo sem fronteiras, pensar o halal como algo distante de nós não faz mais sentido. Em um mundo sem fronteiras, o consumo ético e halal também vão ficar sem fronteiras”, disse Frisso. A diretora afirmou que o halal não é mais uma questão regional e não se reduz apenas aos países de maioria islâmica, mas deve alcançar a população muçulmana onde ela estiver, seja nos Estados Unidos, na Europa ou até mesmo no Brasil.
Outro ponto da pesquisa foi a importância da confiança para os consumidores que seguem o Islã. “A certificação halal é importante para ganhar mais confiança dos consumidores”, declarou. Ela ainda afirmou que, de acordo com a pesquisa, as empresas precisam se posicionar e se comunicar com esses consumidores mais conscientes, principalmente os mais jovens, e que a demanda por transparência nas informações sobre os produtos e as práticas das empresas vem crescendo. Frisso disse também que não há consumo dissociado da crença entre os muçulmanos.
A pesquisa foi feita com amostras em países árabes (45%), países da África (16%), países da Europa (25%) e na Malásia (14%). No total, foram 1451 respondentes islâmicos. Foram mais homens do que mulheres.
Alessandra Frisso explicou a escolha dos países. “Os países árabes têm tradição muçulmana majoritária; a Malásia é o país líder do mercado islâmico, a Nigéria é um mercado grande com muitas oportunidades de desenvolvimento; os consumidores da Europa valorizam a identidade muçulmana com muito orgulho, normalmente, é uma população jovem”, contou.
A pesquisa também trouxe alguns impactos da pandemia nesse mercado consumidor. Os muçulmanos passaram a utilizar mais as plataformas de e-commerce locais, como Noon e Souq, delivery, novas formas de pagamento digitais, e com isso, a confiança nas transações aumentou. Na logística, houve uma necessidade de criar centrais de estoque nos países, além da utilização de ferramentas como o blockchain e a rastreabilidade dos produtos.
A população muçulmana está mais conectada e tem alto poder aquisitivo, diz a pesquisa, e com a pandemia houve uma mudança no hábito de compras, com o crescimento do ‘social commerce’ em plataformas como Facebook e Instagram. “A capacidade de conversão de propaganda em vendas é muito alta, mesmo com Whatsapp e ferramentas similares”, contou Frisso.
Quanto à segurança alimentar, a pandemia incentivou as pequenas produções, a tecnologia alimentar, o monitoramento de preços e a agricultura em ambientes controlados. Por um lado, o muçulmano passou a comprar mais produtos voltados à saúde e bem-estar, e por outro, cresceu o consumo de produtos industrializados no período. Os alimentos processados, que até então representavam 40% do consumo dos muçulmanos, agora estão em 50%. Frisso afirmou que tal crescimento aponta que este consumo pode avançar ainda mais nos próximos anos.
Os muçulmanos reciclam embalagens, não se incomodam em comprar produtos de segunda mão, preferem comprar de empresas da vizinhança, preferem marcas que não pratiquem crueldade animal, são engajados em discussões sobre as marcas nas redes sociais, evitam marcas acusadas de corrupção e consideram os valores religiosos na compra de produtos. Esses tópicos foram avaliados por região. Nos países árabes, africanos e principalmente na Malásia, esses valores são mais levados em consideração. Nos países europeus, um pouco menos, mas ainda são bastante relevantes.
“Para os entrevistados, os preceitos do Islã estão presentes no cotidiano e no estilo de vida. O estudo demonstra que há uma valorização intrínseca quanto aos elementos norteadores do islamismo”, disse Frisso. Além dos princípios religiosos se notou um entrelaçamento na conduta e responsabilidade quanto ao convívio social, como agir com modéstia e praticar caridade.
A família compartilha fortemente os valores do halal, segundo a pesquisa da H2R. “É importante que as embalagens dos produtos contenham informações sobre os alimentos, o consumidor islâmico exige essa transparência, com prazo de validade e informações nutricionais, por exemplo”, disse Frisso. Muçulmanos também querem informações sobre como os produtos foram feitos e qual o país de origem. A pesquisadora deu como exemplo o uso de QR Code nas embalagens para trazer mais confiança, rastreabilidade e integridade da cadeia produtiva, além de gerar mais informações, como trazer receitas e contar a história daquele produto, gerando uma comunicação ativa com o consumidor.
O gerente de Inteligência de Mercado da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Marcus Vinícius, também participou da apresentação. Ele trouxe dados sobre a estimativa de crescimento da população muçulmana. “Para 2030, enquanto é estimado um crescimento de 9% da população mundial, a população muçulmana crescerá quase o dobro, 16%, e sua participação aumentará em 5%”, contou.
A Organização para a Cooperação Islâmica (OIC) compreende 57 países membros, sendo 22 árabes. Vinícius falou ainda sobre a estimativa de crescimento do mercado halal global. “Em 2019, esse mercado era de US$ 4,88 trilhões. Para 2024, estima-se que chegará a US$ 5,74 trilhões, um crescimento de 18%”, disse. Esse mercado compreende não só alimentos e bebidas, mas fármacos, turismo, mídia e recreação, moda, finanças islâmicas e cosméticos.
O fórum Global Halal Brazil foi promovido pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira e a Fambras Halal, com patrocínio da Agência Brasileira de Promoção das Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), BRF, Pantanal Trading, Portonave e Iceport.
Acompanhe a cobertura completa do fórum:
Seção Fórum de Negócios Global Halal Brazil
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