Isaura Daniel
São Paulo – O Brasil começou a importar cravo-da-índia das Ilhas Comores neste ano. O país árabe, formado por três ilhas do Oceano Índico entre Moçambique e Madagascar, vendeu para os brasileiros 40 toneladas do produto entre janeiro e setembro deste ano. Apesar de pequeno, o volume significa um quarto do total das importações de cravo-da-índia feitas pelo Brasil no período.
Na base de dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) não há registro de outra importação de cravo das Ilhas nos últimos oito anos. A receita obtida pelo país árabe com a venda foi de US$ 83 mil, o que significa 19% dos gastos do Brasil com compras internacionais do produto. O valor também representa 83% das exportações do país africano para o Brasil nos nove primeiros meses deste ano.
Apesar de ter importado cerca de 174 toneladas de cravo-da-índia até setembro deste ano, o Brasil possui plantação local do produto. A maior região produtora é o Sul da Bahia, onde cerca de 11 municípios mantêm uma área com cerca de sete mil hectares. A safra, porém, oscila de volume a cada ano em função do ciclo dos craveiros, o que acaba impulsionando as importações em épocas de colheita menor.
"Parte dos botões das flores também acabam sendo estragados durante a colheita, o que faz diminuir a produção no ano seguinte", diz a engenheira agrônoma da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrário (EBDA), Ana Cristina Souza dos Santos. No ano passado, por exemplo, quando a colheita atingiu seis mil toneladas, um volume considerado bom, as importações estavam em apenas 29 toneladas entre janeiro e setembro. No mesmo período deste ano elas aumentaram seis vezes em volume.
"Ainda não temos uma estimativa de produção para este ano, mas com certeza a safra vai cair", diz Ana Cristina. A produção do Sul da Bahia significa cerca de 90% da colheita nacional de cravo-da-índia. De acordo com a engenheira agrônoma da EBDA, os produtores locais, porém, estão desestimulados em função da queda ocorrida nos preços. "Há dez anos um quilo de cravo-da-índia valia entre R$ 15 e R$ 20. Atualmente o preço está entre R$ 6,5 e R$ 7", diz Ana.
Ela acredita que esse desestímulo está impulsionando o aumento das importações, já que não há muitas perspectivas de aumento de área e produção. "Como o preço caiu muito, os produtores começaram a abandonar as plantações", explica. A EBDA está trabalhando para fomentar a produção de cravo-da-índia, mas a retomada do setor é demorada, já que cada craveiro leva entre cinco e sete anos para começar a dar flores após ser plantado.
Flor vira especiaria
O cravo-da-índia é na verdade a flor do craveiro, que é colhida ainda fechada e posta para secar ao sol. Há países que utilizam estufa para a secagem e também fazem a colheita de forma química. Nesse caso, produtos químicos são aplicados sobre a planta, cujos botões secam e depois caem. Na Bahia, porém, a colheita ainda é manual.
A maior parte dos cravos produzidos no país é utilizada na culinária, como especiaria. O produto, porém, também pode ser usado para fabricação de medicamentos, como anestésicos, cigarros aromatizados e de óleos perfumados. Ana Cristina diz que os produtores da Bahia têm interesse em atrair para a região empresas de cigarro para utilizar a produção local.
O país dos perfumes
Nas Ilhas Comores, que figura entre os principais produtores de cravo-da-índia, ao lado de Indonésia e Madagascar, o produto é muito utilizado para fabricação de perfumes. O país é, aliás, grande produtor de óleos perfumados. As Ilhas Comores são o maior fabricante mundial de essência de perfume ylang ylang, extraída de uma flor. O óleo perfumado foi o segundo e único outro produto, além do cravo, que o Brasil importou do país árabe entre janeiro e setembro deste ano.
A agricultura e a pesca representam 40% do Produto Interno Bruto (PIB) das Ilhas Comores e empregam 80% da população. O turismo é outra atividade econômica importante. O país tem uma população pequena, de 770 mil pessoas, e um PIB de US$ 260 milhões. Os principais parceiros comerciais das Ilhas são França, África do Sul, Quênia e Paquistão.
A corrente comercial entre o Brasil e as Ilhas Comores ainda é pequena. Até o mês de setembro, foram negociados US$ 764,4 mil entre os dois países. A maior parte das exportações brasileiras para as três ilhas – US$ 667 mil – foi de carne bovina e de frango. A renda per capita da região se resume a US$ 337.
Domínio francês
As Ilhas Comores são, na verdade, o cume de uma cadeia montanhosa vulcânica submersa pelo mar. A maior ilha é Ngazidja, onde fica a capital do país, Moroni, com cerca de 30 mil habitantes. As outras duas ilhas são Mwali e Nzwani. As três ilhas viveram sob domínio da França entre 1947 e 1975, quando alcançaram a independência.
Depois disso, porém, a região viveu alguns conflitos. As ilhas Mwali e Nzwani tentaram o separatismo para voltar ao domínio francês. Há pouco mais de três anos, a Organização da Unidade Africana (OUA) intermediou um acordo que mantém as três ilhas unidas. O entendimento trouxe mais autonomia para cada uma das ilhas.
O país vive sob uma república presidencialista, mas passou por 19 golpes de estado nos últimos 25 anos. Quase a totalidade da população é muçulmana. Os idiomas falados localmente são o árabe, o francês e o comorense.