São Paulo – Em Amã, capital da Jordânia, o artista Jonathas de Andrade procurou Jesus no rosto de homens comuns. Nascido em Maceió, Alagoas, e residente no Recife, Pernambuco, Andrade foi convidado a participar de uma residência artística na cidade em 2013, na fundação jordaniana Darat al Funun. Foi andando nas proximidades do Rio Jordão que ele decidiu trabalhar com a visão eurocêntrica que a imagem bíblica ganhou no imaginário de países como o Brasil.
Para isso, ele saiu pelas ruas do país árabe e clicou 20 homens diferentes. Depois, o brasileiro questionou diferentes jordanianos sobre qual daquelas opções poderia refletir na figura bíblica e que é um dos profetas na religião islâmica.
O resultado é a instalação Procurando Jesus. Junto às fotos em moldura de cobre, o artista expõe 16 placas de acrílico com textos das respostas que obteve nas ruas. Todos os escritos têm versões em inglês, português e árabe, caligrafados por um jordaniano. Por fim, há tâmaras oferecidas aos visitantes, que podem utilizar as sementes da fruta para votar na foto que mais lembre Jesus.
A obra foi apresentada no mesmo ano na própria fundação, em Amã. “Pensar a imagem de um profeta para a cultura muçulmana é desconfortável. São provocações. Mas volta também na ideia de beleza, o que se espera de Jesus como uma figura”, disse ele à ANBA.
O artista formado em Comunicação Social afirma que a mistura de métodos – como fotografia e interação com o público – o ajudou a criar a narrativa. “Eu proponho com o trabalho uma votação para decidir uma nova imagem de Jesus. Tem todo um questionamento sobre a identidade ocidental, muito eurocêntrica, por conta da iconografia italiana”, explicou.
Em suas andanças pela capital da Jordânia, o artista mostrava um texto aos entrevistados. “Me dei conta de que… Como seria esse jovem? Seria com que cabelo? Teria brilho no olhar? Criei esse texto, quando caminhei pelo Rio Jordão, que incorpora um personagem como se eu tivesse essa missão. [No texto] digo que era meu dever criar uma nova imagem de Jesus”, declarou ele, que trouxe essa escrita também para a exposição.
De Amã para o Brasil
A exposição já passou por Florença, Itália, no Museu Marino Marini (foto do topo), em 2014. Agora, seis anos depois da concepção, a obra é exposta pela primeira vez no Brasil. A montagem está na 21ª Bienal De Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil, em São Paulo, onde segue até o ano que vem. “Em 2019, é outro contexto político. Está sendo interessante remontar esse trabalho. Na parede, um calígrafo sírio montou os textos. Ele chegou há apenas quatro meses no Brasil, o conhecemos porque entramos em contato com a [ONG] Abraço Cultural”, explicou o artista sobre a montagem brasileira, que teve o trabalho do sírio Samir Awad.
Antes da Jordânia, o artista já havia passado pelo Egito. Aos 37 anos, Andrade acredita que foi a vivência nordestina o conectou mais a esses locais. “Eu já tinha ido ao Cairo em outra residência, em 2011. Passei 40 dias e foi superforte para mim meu primeiro contato com uma cultura. Foi a primeira vez que fui a um país de língua árabe. Eu me impactei bastante com a semelhança do povo [egípcio] com o povo nordestino e brasileiro. Meus próprios traços físicos… As pessoas achavam que eu era dali”, revelou o brasileiro, que também visitou o Líbano.
A passagem pelos países do Levante trouxe ao artista novas perspectivas. “Foi muito interessante ver Jordânia e entender melhor a região, que é absolutamente complexa e muito estigmatizada pela mídia mundial dominante. Ir para lá, conversar com pessoas, fazer amigos foi super importante para entender as nuances. Entender como eram essas culturas antes das guerras. Guerras recentes. É próxima do Brasil com questões do povo, mas também é muito diferente… As pessoas aqui pouco conhecem essa realidade (dos países árabes)”, destacou.
Em novembro, Jonathas de Andrade vai iniciar uma série de exposições em Pernambuco, com o projeto “Caravana Museu do Homem do Nordeste”. Além disso, a fundação Darat al Funun convidou o artista para retornar a Jordânia no próximo ano. A ideia é levar o brasileiro para desenvolver um projeto que incluirá o vídeo “O peixe”, descrito por ele como um de suas principais obras.