São Paulo – Quanta comida é produzida no mundo? E quanta é jogada no lixo? Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), 1,3 bilhão de toneladas são desperdiçadas ou se perdem ao longo das cadeias produtivas de alimentos, ou seja, 30% de toda a comida produzida por ano no mundo. Foi com isso em mente que a advogada Daniela Leite (foto) criou o aplicativo Comida Invisível, que conecta potenciais doadores de alimentos – como restaurantes – com quem precisa, como ONGs.
A ideia surgiu há mais de quatro anos, durante uma visita à Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp). Lá, ela se deparou com quilos de alimentos sendo descartados. Naquele dia, a advogada queria comprar frutas maduras para fazer geleia. Acabou criando uma empresa que conecta pessoas e, pode-se dizer, redistribui alimentos.
“Me deparei com todo aquele desperdício. Pilhas de frutas, mamão ainda bom. Aí surgiu uma investigação que começou no banco de alimentos do Ceagesp sobre o que chegava e o que era descartado. Depois, veio uma ideia de projeto de lei que apresentei na Câmara dos Vereadores de São Paulo. Disso nasceu o Comida Invisível”, contou Leite, diretora geral da empresa à ANBA.
O projeto de lei não foi implementado, mas a semente do Comida Invisível já estava plantada. “O grande foco é a questão da alimentação. Somos uma empresa social, pensamos questões para gerar valor para sociedade”, explica a idealizadora. A iniciativa começou com estudos sobre desperdício, depois com ações educativas com “food trucks”. Por fim, veio o aplicativo, inicialmente desenvolvido para Android. “Fomos entendendo como ampliar, ir além e oferecer também para as pessoas físicas se cadastrarem. Reescrevemos para ser uma plataforma que atendesse computadores e celulares”, revelou ela sobre o processo para chegar até a nova versão do aplicativo, que agora não precisa ser baixado e pode ser acessado diretamente no navegador.
A empresa é certificada pelo Save Food, da FAO. “Somos um ‘hub’ de soluções tecnológicas contra o desperdício. Essa é a razão do nosso existir. Também atuamos bastante com políticas públicas para ter legislações adequadas e que permitam que isso (iniciativas contra desperdício) aconteça”, explicou Daniela, que coordena o Núcleo do Direito Humano à Alimentação na Ordem dos Advogados do Brasil, seção de São Paulo (OAB-SP).
Daniela conta com sócios em áreas como tecnologia, marketing e comercial. “A plataforma foi desenvolvida pensando em expansão para América Latina e está, em si, pronta para isso”, revelou a criadora. Na primeira versão, foram 3 mil downloads, a maioria deles na cidade de São Paulo, mas há empresas de outros estados que já têm cadastro, como o Rio de Janeiro. Entre os estabelecimentos cadastrados, 350 são restaurantes e 400 ONGs. Para o relançamento, quem já estava cadastrado continua tendo acesso ao conteúdo.
Nova versão e ação na Fispal
Pronto, o novo formato foi lançado durante a Fispal Food Service, feira especializada em alimentação fora do lar, que ocorreu de 11 a 14 de junho, na capital paulista. Para o lançamento, o Comida Invisível fez uma ação/evento. A plataforma arrecadou todos os restos de comida da feira para fazer compostagem. Os resíduos orgânicos foram separados e vão se tornar adubos em horta de uma empresa parceira. Tudo o que vier desta horta vai ser doado por meio do aplicativo.
Entre as novidades da nova versão, pessoas físicas agora também podem fazer doações. A plataforma também disponibiliza um selo para os restaurantes que fazem doação. “A ideia é que eles possam se comunicar como restaurantes que têm responsabilidade maior em relação aos alimentos”, explicou Daniela. Outro serviço que o Comida Invisível fornece é o MIND – mapa de indicadores do não desperdício. As empresas que assinam a opção recebem orientações sobre cinco categorias de indicadores, que englobam desperdício geral, como de consumo de água, luz e gás.
Como juntar a fome com a vontade de doar?
O aplicativo é gratuito e foi montado a partir das normas da Vigilância Sanitária. Para se cadastrar, o doador deve indicar o responsável técnico, que terá condições de avaliar se aquele alimento é próprio para consumo e passar por uma tela que explica políticas de boas práticas da Anvisa. Entre os itens estão cuidados para evitar contaminação cruzada e sobre o transporte das mercadorias.
A partir do momento em que os envolvidos aceitam fazer e receber a doação, abre-se uma possibilidade de troca de mensagens e é possível combinar quem vai levar ou buscar a doação. A criadora do Comida Invisível explica que quem cadastra os itens é responsável pelas informações, como o estado dos alimentos e a data de validade. Como toda doação, é sempre bom lembrar e um texto que descreve as tarefas do doador avisa: “Só doe aquilo que você utilizaria na sua casa”.
A plataforma é apoiada por pessoas como a chef de cozinha Paola Carosella e a apresentadora de televisão e ativista Bela Gil. Veja, abaixo, o vídeo institucional do Comida Invisível: