Alexandre Rocha
e Marina Sarruf, enviados especiais
Brasília – A ampliação das relações econômicas foi um dos principais assuntos do primeiro dia de debates da cúpula dos países árabes e sul-americanos, que começou ontem (10) e termina hoje em Brasília. "O foco de nossas atenções foram os interesses comuns, principalmente no que diz respeito à economia, o comércio e os investimentos, e com especial ênfase na criação de mecanismos para a promoção de parcerias", resumiu Mohamed Benaïssa, ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação do Marrocos, país que se ofereceu – e foi aceito – para sediar a próxima edição da cúpula, em 2008.
O dia foi dividido em dois painéis. No primeiro, o tema foi "Cooperação bi-regional através do comércio, investimentos e negócios". No segundo foram discutidos o "Diálogo político e o intercâmbio cultural". Logo na cerimônia de abertura, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a necessidade de se promover o equilíbrio no comércio internacional. "Devemos nos firmar diante de uma ordem econômica resistente à transformação e aos interesses dos países em desenvolvimento", disse.
Na mesma linha, o presidente da Argélia, Abdelaziz Boutlefika, declarou que os árabes e sul-americanos devem utilizar a globalização em proveito próprio. "Podemos fazer com que a globalização funcione a nosso favor. Para isso é preciso promover o comércio sul-sul e uma maior cooperação", afirmou.
O secretário-gera da Liga dos Estados Árabes, Amr Mussa, ressaltou, por sua vez, que "já existem raízes profundas para essa cooperação", principalmente por causa da influência da imigração árabe para a América do Sul. Acrescentou que a idéia agora é buscar conjuntamente o desenvolvimento, o crescimento econômico, a justiça e a paz internacional.
Já nos debates, o chanceler do Egito, Ahmed Aboul Gheit, destacou que as relações entre as duas regiões têm que ter uma agenda clara, que indique um caminho a seguir não só para os árabes e sul-americanos, mas para todos os países em desenvolvimento. Ele destacou a necessidade de um posicionamento conjunto frente aos desafios do comércio internacional, muito influenciado pelo poderio econômico dos países ricos.
Os participantes destacaram também a necessidade de se promover reformas nos organismos internacionais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), para que eles atendam aos interesse dos países em desenvolvimento. "É preciso mudar o sistema político e econômico que alguns países desenvolvidos estão impondo por meio dos mecanismos internacionais", disse o presidente da Guiana, Bharrat Jagdeo.
Além de reformas institucionais, os participantes defenderam o aumento do comércio sul-sul como de máxima importância. "É preciso encontrar outros mercados, que possam também encorajar os investimentos", afirmou o primeiro-ministro do Líbano, Nagib Mikati, que também ressaltou a ligação "orgânica" que existe entre as duas regiões, principalmente por casusa da imigração.
O vice-presidente da Colômbia, Francisco Santos Calderón, foi mais longe e, além da ampliação do comércio, defendeu negociações para a criação de uma área de livre comércio entre as duas regiões. "Com este diálogo queremos criar um caminho seguro para os investimentos e o comércio", ressaltou.
Transporte
Já o chanceler do Sudão, Mustafa Osman Ismail, destacou a importância da cooperação na áera de transportes, para diminuir os efeitos da distância que separa as duas regiões. "Todos nós árabes que viemos para cá tivemos que fazer escala em alguma capital européia", observou.
O "diálogo de civilizações" foi uma das expressoões mais usadas nos debates de ontem. Para o presidente do Uruguai, Tabaré Vásquez, o mundo não está condenado ao "choque de civilizações", nem ao "fim da história". Em sua avaliação, a cúpula de Brasília mostra que o diálogo é possível e, por si só, constitui um passo a mais na história.
"O diálogo de civilizações constitui em abrir caminhos em todos os níveis", acrescentou o ministro das Relações Exteriores da Líbia, Abdelrahman Mohamed Shlaqam. Já o primeiro-ministro da Síria, Mohammad Naji Al-Otri, defendeu também o aprofundamento das relações culturais, principalmente com o intercâmbio de professores universitários.
Estabilidade
O respeito ao direito internacional, a busca da paz e da estabilidade, a condenação ao terrorismo e a reforma da Organização das Nações Unidas (ONU) também foram assuntos recorrentes nos encontros. O presidente do Iraque, Jalal Talabani, pediu, por exemplo, o apoio dos países participantes para restabelecer a independência do seu país e ajudar no processo de reconstrução. Ele sugeriu, inclusive, o envio de missões econômicas para "conhecer as possibilidades de investimentos" existentes no Iraque.
Assim como no caso das instituições econômicas e financeiras internacionais, os líderes árabes e sul-americanos defenderam maior espaço para os países em desenvolvimento na ONU, inclusive com a ampliação do Conselho de Segurança. O apoio à criação de um estado palestino foi também reiterado por todos.
Chávez
Alguns participantes propuseram ações específicas, como foi o caso do presidente da Venezuela Hugo Chávez, que lançou a idéia, por exemplo, de se criar um "fundo de atenção social" mantido pelos países das duas regiões. Ele disse também que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), da qual a Venezuela faz parte, também pode ajudar na cooperação entre árabes e sul-americanos.
Chávez provocou risos ao falar da criação de uma agenda clara de trabalho para dar um rumo esratégico às relações entre as duas regiões. Ele comparou a cúpula ao primeiro encontro com a primeira namorada. "É preciso ser cuidadoso", disse.
O ministro das Relações Exteriores do Kuwait, Mohammad Sabah Al-Salem Al-Sabbeh, por sua vez, defendeu a ajuda financeira aos países mais pobres e destacou os projetos que seu país desenvolve nesta área.
A encerrar os encontros de ontem, Lula disse: "já estamos fazendo as malas para ir ao Marrocos em 2008". Os debates da cúpula continuam hoje pela manhã, último dia da reunião de chefes de estado.