Débora Rubin
São Paulo – Talvez você já tenha jogado um papel numa lixeira desenhada por Karim Rashid ou até mesmo usado algum produto cuja embalagem tenha sido desenvolvida por ele. Suas criações estão por todas as partes: de um frasco de perfume à decoração de um restaurante. Do projeto gráfico de uma revista ao novo modelo da Melissinha (sandálias de plástico da Grendene). Toda grande empresa que quer dar uma remodelada em seu produto procura Rashid. Seu produto preferido é o plástico – e, de preferência, tudo muito colorido. Sua meta é fazer design em escala, para todos. A lixeira Garbino, desenhada para a Umbro, por exemplo, vendeu mais de 4 milhões de unidades em todo o mundo.
Rashid, 46 anos, nasceu no Cairo, foi criado no Canadá, viveu na Europa e hoje fincou raízes em Nova York. Homem do mundo, usa todas as influências – sobretudo as árabes, herdadas de seu pai – em seu trabalho. Para expandir ainda mais sua marca, ele abriu seu escritório no Brasil há poucos meses, em parceria com as arquitetas Camila Tariki e Carolina Sucar. Conheça mais sobre esse "poeta do plástico", como ele é conhecido, na entrevista dada à ANBA.
ANBA – Você é uma pessoa globalizada, nasceu no Cairo, cresceu no Canadá, estudou na Itália e vive em Nova York. Seus produtos são resultado direto dessa sua essência cosmopolita?
Karim Rashid – Como eu cresci em muitos países, alguns pobres, percebi que a beleza e produtos inteligentes e interessantes deveriam ser acessíveis a todos. E o plástico permite que os produtos sejam mais baratos e democráticos. Eu faço design para todos, sou um advogado e pregador da "designocracia". Nem sempre é possível controlar o mercado, a distribuição e os preços das empresas, mas eu sempre tento convencê-las a fazer as coisas menos caras, a usar técnicas ou estratégias para diminuir o preço e chegar a um público maior. Se vamos viver em um novo mundo contemporâneo, sensual, orgânico e inteligente, temos que alcançar a todos. Eu penso nos nossos novos objetos como "globjetos" – objetos globais sob demanda – peças que transcendem lugar, local, cultura, credo, raça, que são nômades e onipresentes.
Quais são as suas lembranças da sua infância no Cairo? O que você ainda tem de árabe, além do seu nome?
Na verdade, sou um quarto irlandês, um quarto inglês, um quarto argelino, um quarto egípcio e falo uma série de línguas. Eu acredito que como um designer americano, tenho esse lado mais casual, o design democrático, a mobilidade e a facilidade. A influência européia da minha criação é o lado mais romântico e poético (tive uma criação tumultuada – do Cairo para Paris, para Roma e para Londres) e o lado árabe é provavelmente o lado mais apaixonado e artístico. O lado britânico é o mais pragmático e de negócios. O lado canadense é minha falta de senso de humor e modéstia (risos).
É verdade que esses seus símbolos (que ele tem tatuado no corpo, espalhados pelo site e em seus produtos) foram inspirados nos hieróglifos egípcios?
Não, não foram conscientemente derivados dos hieróglifos. Vieram como uma frustração nos anos oitenta por eu não conseguir crédito pelos produtos que eu desenhava. Daí comecei a marcar os produtos com uma pequena cruz, e então um asterisco, e eventualmente um número 8…e agora tenho 54 símbolos que são uma linguagem. Eu acho que de alguma forma esses símbolos que eu desenvolvi ao longo dos últimos 20 anos simplesmente saíram de mim, um processo visceral. Mas agora eu vejo claramente a conexão. Na verdade, muitas pessoas olham meus braços e me perguntam se as tatuagens são egípcias. Estranho como temos tudo isso no nosso DNA. Eu sou muito matemático, o que também é um traço bem egípcio.
Seu pai também era designer. É ele seu grande mestre?
Eu percebi minha missão de vida aos cinco anos de idade. Fui fazer desenhos de igrejas com meu pai na Inglaterra. Ele me ensinou a ver – ele me ensinou perspectiva com essa idade – ele me ensinou que eu poderia desenhar qualquer coisa. Eu não sabia falar, na época tinha uma gagueira muito forte e um distúrbio na fala, então eu me refugiava em ficar desenhando sozinho por horas porque eu era tímido e tinha medo do mundo.
O mundo ainda tem muito a ser "redesenhado"?
Design é toda a paisagem construída. Design é contemporaneidade, é viver o momento. Está em todos os ambientes, no doméstico, nos transportes, hospitais, produtos. Design está em tudo – e infelizmente 90% é péssimo. Tudo precisa de design, desde o interior dos aviões aos frascos de xampu. Até o dinheiro precisa dele. Precisamos embelezar o planeta em todos aspectos, em cada canto da Terra.
Por que o design é tão importante assim na vida das pessoas?
Todos objetos e espaços têm linguagem semântica. Eles falam conosco. Certas formas, linhas, cores, texturas, funções, todas tocam e comunicam com nossos sentidos e nossas experiências diárias. Objetos e espaços precisam tocar nosso lado sensual, tocar nossas emoções, eles precisam elevar uma certa experiência e precisam ser humanos. Amor e desejo são parte dos meus interesses em tornar nosso mundo material físico um pouco mais sensual.
Por que você abriu um escritório no Brasil?
Por que eu acho o Brasil um epicentro extraordinário para cultura, arte, design. E a cultura é tão vibrante, positiva e otimista que torna o ambiente perfeito para o design.
E como você vê o design no Brasil hoje em dia?
Eu vejo que existe uma demanda fenomenal vinda do público, mas não há uma resposta ou oferta pelos produtores locais.
O termo "poeta de plástico" te incomoda?
Por que deveria? Eu sempre quis ser um poeta ou filósofo.
Mera curiosidade: por que suas peças são tão coloridas enquanto você só se veste de branco?
Na virada do milênio eu comprei uma calça jeans branca, um suéter branco, 30 cuecas brancas e 30 camisetas brancas. Decidi que a partir daquele momento só usaria branco. Foi difícil achar roupas brancas para homens e ainda é. Preto é simplesmente tão cansativo. Branco é muito mais legal. Branco é otimista, futurista, positivo, liberal, cabeça aberta e simplesmente mais livre. Qualquer cor engrandece perto do branco e o papel branco é o ponto de partida dos desenhos. Sobre meus objetos, o engraçado é que quando eu estava na universidade eu só usava preto, cinza ou branco nas minhas peças. Eu era anticor por que eu pensava que a cor distraia do objeto. Mas à medida que eu fui ficando mais velho, a cor começou a inchar de dentro de mim e eu fui me tornando uma explosão de cor. O mundo é bastante cinza e chato e nós precisamos criar grandes traçadas de cor em todos os lugares, na nossa arquitetura, até mesmo nas nossas paisagens. Cor é um dos mais incríveis fenômenos do nosso universo.
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Karim Rashid Brasil
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Site: www.karimrashidbrazil.com