São Paulo – Que o Brasil importa produtos da China, dos Estados Unidos, da Argentina, não é novidade para quase ninguém. Mas e a África? O continente vende alguma mercadoria para o mercado brasileiro? Sim. Os africanos são fornecedores de produtos dos quais o País se abastece no exterior, inclusive em setores bastante essenciais, como de fertilizantes e de petróleo.
No primeiro semestre deste ano, o Brasil comprou 5,2 milhões de toneladas em produtos africanos, o que significou um gasto de US$ 3,8 bilhões. A África respondeu por 3% do que o mercado brasileiro importou no período em valores e por 6,1% em quantidade. O avanço sobre igual período do ano passado foi de 51% em receita, mas de apenas 3,2% em volume.
“Não houve uma grande alteração no interesse, no apetite pelos produtos, eles são muito espelhados no que já existe há algum tempo”, afirmou para a ANBA o presidente do Instituto Brasil-África (Ibraf), João Bosco Monte. O crescimento expressivo em valores se deu principalmente em função da alta dos preços internacionais.
O produto que o Brasil mais traz da África é o fertilizante. Os adubos respondem por mais da metade de tudo o que o País compra do continente, com US$ 2 bilhões e 2,8 milhões de toneladas no primeiro semestre. O segundo produto da pauta é o petróleo, com US$ 977,5 mil e 1,4 milhão de toneladas.
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“A ureia tem uma contribuição muito grande”, afirma Monte sobre a pauta, explicando que esse fornecimento tem na Nigéria uma das principais fontes. O país africano saiu de uma exportação de 226 mil toneladas de fertilizantes para o Brasil nos seis primeiros meses de 2021 para 606 mil toneladas nos mesmos meses deste ano, de US$ 71,8 milhões para US$ 447 milhões.
Conta do fertilizante e do petróleo feita, os US$ 825 milhões em receita e 942 mil toneladas que restam nesse comércio são formados por uma lista diversa. Ali estão pérolas, pedras e metais; produtos químicos; alumínio e obras; sal, enxofre, terras e pedras, gesso, cal e cimento; reatores nucleares; minérios; cacau e preparações; ferro; frutas, borracha e obras; máquinas e aparelhos; peixes e crustáceos; vidros e obras, e outros que tiveram valor abaixo de US$ 10 milhões no primeiro semestre.
O presidente do Instituto Brasil-África afirma que o montante que o Brasil importa da África é pequeno se comparado ao geral. “Mas faz uma diferença grande quando um país do tamanho do Brasil se apresenta como cliente de um país pequeno como Togo, Benin, Cabo Verde”, diz. Monte cita como exemplo as vendas de atum de Cabo Verde ao mercado brasileiro. “Representa bastante para Cabo Verde”, diz. Os africanos venderam 16,2 mil toneladas em peixes ao Brasil no primeiro semestre.
Potencial pouco explorado
João Bosco Monte acredita que os embarques de produtos da África rumo ao Brasil poderiam ser bem maiores. Ele acha que é preciso mais promoção comercial por parte da África no mercado brasileiro e que o Brasil deveria ter mais linhas de financiamento para importações do continente. “Entendo que a mea-culpa tem que ser feita de um lado e de outro”, afirma.
Os brasileiros não conhecem o desenvolvimento e nem os produtos que a África produz? “A nossa percepção, o nosso trabalho quase de evangelização é fazer com que as pessoas entendam que do outro lado do Atlântico tem um potencial gigantesco de oportunidades, inclusive comerciais”, diz Monte.
O presidente do instituto cita as fazendas produtoras de milho, leite e gado e a produção de nitrogênio na África do Sul, os parques tecnológicos de Ruanda, o sistema de telefonia celular do Quênia, a rede de distribuição no Canal de Suez do Egito, a produção de cimento da egípcia de Alexandria, o processamento de castanha-de-caju de Gana, a perspectiva de produção de vacinas no continente, o know-how em treinamento de aviação na Etiópia pela Ethiopian Airlines, entre outros.
Atualmente, os maiores fornecedores africanos do Brasil são os produtores de petróleo e fertilizantes do continente. Marrocos, grande produtor de fertilizantes, é o primeiro da lista, seguido por Nigéria, que produz adubos, além de petróleo. Integram as dez primeiras posições no ranking de fornecedores ainda África do Sul, Argélia, Egito, Congo, Angola, Tunísia, Costa do Marfim e Togo. Monte vê as importações de produtos como petróleo e adubos como importantes para a criação de uma regularidade no comércio e no transporte, incentivando também as trocas em outras áreas.
E o navio?
O presidente do Ibraf acredita que para que esse comércio cresça, é preciso maior fluxo de transporte marítimo – e direto – entre África e Brasil. “Não há rotas frequentes e constantes”, afirma ele. No comércio entre as duas regiões, as mercadorias precisam normalmente ir até a Europa e de lá seguir caminho para o destino final, tornando o produto mais caro e maior o tempo de transporte necessário.
Ao longo dos últimos anos, as importações brasileiras de produtos africanos tiveram oscilações, mas se mantiveram entre 12 milhões de toneladas e 22 milhões de toneladas de 2011 a 2021. O maior pico de vendas foi em 2013, com 22,4 milhões de toneladas embarcadas, e o menor volume se deu em 2020, com 10,8 milhões de toneladas.
Monte vê benefícios na aproximação maior do Brasil com a África também em função da formação da área de livre-comércio do continente e da perspectiva da região, com países crescendo acima da média. “A África em 2022 tem 1,4 bilhão de pessoas e em 2050, daqui menos que três décadas, pode chegar a dois bilhões de pessoas”, diz.