São Paulo – Desde que a China habilitou mais frigoríficos brasileiros a exportar carne bovina para o país, não é só no mercado interno que os preços do produto subiram. O aumento também foi registrado no preço pago pela carne exportada em geral. Em novembro de 2019, a tonelada da carne in natura foi vendida por US$4.857,6. O valor é 21,6% maior do que o negociado no mesmo mês de 2018.
Os dados são do Ministério da Economia, divulgados no dia 02 de dezembro, e mostram aumento também na receita com as vendas externas. Em novembro de 2019, os embarques brasileiros de carne bovina in natura somaram US$ 755,8 milhões, 45% a mais do que no mesmo mês de 2018. Na mesma comparação, o volume embarcado subiu 19,3%, somando 155,6 mil toneladas em novembro de 2019.
Para explicar a alta nos preços, o pesquisador de pecuária do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP, Thiago Bernardino de Carvalho, aponta também fatores internos. Para ele, os baixos preços no mercado interno nos últimos três anos desestimularam os produtores a confinar o gado, poupando investimento em ração e milho, o que influenciou no desenvolvimento dos animais.
“Somando-se a isso, a demanda interna melhorou e coincidiu com o final do ano, quando atacado e varejo fazem estoque para as festas. Aí veio a cereja do bolo, que foi a China, que representou mais de 50% desse aumento nas exportações”, apontou Carvalho.
Para o pesquisador da USP, a movimentação no Brasil é fator que influencia o mercado internacional. “Se o nosso preço sobe, sobe no mercado internacional. O Brasil está para carne bovina como a Arábia Saudita está para o petróleo. O Brasil regula os preços, por mais que os Estados Unidos sejam maior exportador, nós temos o maior [rebanho de] gado”, pontuou ele.
Carvalho disse, porém, que viagens de autoridades brasileiras a países árabes ajudam a equilibrar o mercado. Em setembro a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, realizou uma missão a quatro países árabes, e em outubro quem visitou a região foi o presidente Jair Bolsonaro. Já em novembro, a Arábia Saudita habilitou oito novos frigoríficos brasileiros para exportar carne bovina. ” Essa aproximação de acordos comerciais com Arábia Saudita ajuda a manter consistente o mercado”, declarou.
Ele destacou que em outubro deste ano os Emirados Árabes Unidos pagaram 6% a mais pelo produto do que em setembro. Para a Arábia Saudita, o aumento foi de 4%. “O Brasil tem possibilidade de aumentar exportação em volume e qualidade. Eu acredito que o Brasil vai continuar como um dos maiores players”, ressaltou.
Para além do cenário nacional, o consultor da Safras & Mercado, Fernando Henrique Iglesias, lembra que foi a investida chinesa que provocou uma escalada de preços ao redor do mundo. “A China está em situação delicada, por causa da peste suína africana. Eles são o maior mercado consumidor do mundo e estão reabilitando frigoríficos não só no Brasil, mas em outros países também”, apontou Iglesias.
As vendas aos chineses, no entanto, não devem afetar a entrega do produto brasileiro para outros mercados importantes, como Egito, Emirados e Arábia Saudita. “Em volume, não impacta os árabes porque os frigoríficos priorizam mercado externo. O câmbio (dólar) a R$ 4,20 reforça essa estratégia. Quem faz abate halal vai manter [os embarques]. Em 2020 a tendência é se voltar ao mercado externo. Já o preço [da exportação] acaba influenciando o mercado em geral, sim”, explicou Iglesias.
Troca
Com o aumento no preço da carne bovina chegando aos consumidores, a tendência tem sido a escolha de outras carnes. “Há uma dificuldade já do varejo de repassar produto [por causa do preço]. E o consumidor [brasileiro] está optando por frango e suínos”, apontou Carvalho.
A expectativa é que o mesmo movimento seja visto nas exportações, destaca Felipe Novaes, analista de agronegócio da Tendências Consultoria. “Comprometimento de ofertas não, mas em relação de preço, a carne bovina dá a tônica. Isso já se materializa no mercado interno e é transmitido para outras carnes, como a de frango. A escalada de preços da carne bovina ganhou manchetes, mas tem efeito para outras carnes também. De modo geral, o Brasil é um player muito importante para todas as carnes”, apontou Novaes.
Para ele, o mercado ganhou fôlego na habilitação de mais frigoríficos e muitos pecuaristas que protelaram o abate este ano vão ter mais carne para oferecer em 2020. A expectativa da Tendências é de estabilização dos preços pagos ao produtor no primeiro trimestre do ano que vem. O que não quer dizer que os valores vão voltar a níveis mais baixos. “Quando o real se desvaloriza existe tendência a aumentar a oferta do produto brasileiro para o mercado internacional. O outro fator é: está faltando carne no mundo. Isso ainda tende a manter os preços em patamares elevados”, explica o consultor.