São Paulo – A entrada de seis nações no Brics, o grupo de países em desenvolvimento inicialmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, poderá ampliar a corrente de comércio entre os participantes e atrair investimentos, inclusive para o Brasil. Mas desafios que afetam o incremento das relações comerciais, como a bitributação, precisam ser superados.
Em 2001, o economista norte-americano Jim O´Neill criou o termo BRIC em referência às nações com elevada extensão territorial, população e potencial de crescimento. Essa definição deu origem, em 2009, ao primeiro encontro de cúpula do grupo, que, em 2010, acrescentou a África do Sul ao quarteto.
Em 2015, foi criado o New Development Bank (NBD), chamado de “banco do Brics” que, não necessariamente, financia apenas projetos dos integrantes do grupo. Em um novo movimento, na cúpula encerrada em 25 de agosto, seis novos integrantes foram aceitos para compor o grupo: os países árabes Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Egito e os que não são árabes Argentina, Etiópia e Irã.
Essa nova configuração pode trazer novos e mais negócios a todos os integrantes, inclusive o Brasil. Mas antigos desafios precisam ser superados (na imagem acima, os presidentes da China, Xi Jinping; do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva; da África do Sul, Cyril Ramaphosa; e o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi).
Sócio fundador da BMJ Consultores Associados e ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil (2007-2011), Welber Barral avalia que a ampliação do Brics pode trazer investimentos ao Brasil, incrementar a corrente de comércio e elevar os contatos entre os países ao nível diplomático.
“O Brasil hoje já recebe investimentos importantes tanto de fundos soberanos dos Emirados, como é o caso do Mubadala, e de alguns fundos sauditas. Evidentemente, seria necessário avançar na parte de acordo de bitributação, acordos de investimento, para dar mais garantia aos fundos, já que eles têm que se basear, por suas regras de compliance, em rating internacional (que classifica a capacidade de um país ou empresa honrar seus compromissos financeiros) para fazer os investimentos. Mas é um passo importante para permitir justamente esse contato no nível diplomático”, afirma Barral.
Secretário-geral e CEO da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Tamer Mansour, enxerga que há diferentes oportunidades que se desenham ao Brasil na relação com os parceiros árabes do grupo e afirma: “Haverá sim mudança na balança comercial entre esses países”, lembrando que, com a ampliação, o Brics se torna um grupo com 3,6 bilhões de habitantes e com um Produto Interno Bruto (PIB) de US$ 29,1 bilhões.
“Arábia Saudita, por ser um grande exportador de petróleo, pode ser uma das maiores potências dentro do Brics. Os Emirados sempre foram vistos por nós como um hub para reexportação de produtos. Agora será mais ainda, além de sua chegada contribuir também no banco do Brics”, diz Mansour, que também reconhece o papel dos Emirados como grande investidor.
Como exemplo da reexportação de produtos, ele cita a soja em grãos que é processada e transformada em óleo de soja dentro dos Emirados. Esse óleo é, então, vendido para outros mercados. Outro exemplo é o processamento de carne de frango in natura em carne processada. “Se trata de agregar valor ao produto”, diz.
“Em relação ao Egito, vai trazer uma cooperação muito maior. Representa segurança para Brasil, Rússia e China em olhar para a África porque o Egito é a entrada para a África. O país vive um momento complicado com a sua moeda. O Brics abre a chance de pagar suas compras com a moeda nacional (libra egípcia). É um caminho tanto para o Egito como para a Argentina” avalia. “A importância da entrada do Egito supera o olhar de um país para o outro apenas”, diz.
Barral avalia que a ampliação do Brics traz outros benefícios aos seus participantes: permite solucionar problemas entre si, como barreiras sanitárias, e obter certificações necessárias para exportação, o que contribui para ampliar as trocas comerciais. Ele lembra que o Egito e Mercosul (mercado comum que conta com Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai) já têm um acordo de livre-comércio, o que, portanto, não influencia em uma eventual redução de tarifas. “Onde pode haver uma evolução é justamente na parte de investimentos e de, eventualmente, integração das cadeias produtivas. Então, isso o Brics pode trazer à medida que facilite, por exemplo, financiamento para projetos bilaterais por meio do NDB”, diz.
Dar voz ao sul global
Ao olhar o acordo do ponto de vista diplomático, Barral e Mansour avaliam que trazer novos emergentes para o grupo é uma forma de o Brics ganhar peso e influência no cenário internacional.
“Com relação à evolução do Brics, vamos lembrar que os Brics são uma tentativa de dar uma voz às principais potências do sul global para que não fiquem somente a reboque dos países desenvolvidos”, afirma Barral.
“Vejo uma confiança global no bloco. Se era visto com desconfiança, passa a ser visto como um bloco capaz de competir economicamente com outros grupos. Passa a mudar a visão internacional sobre os países (do Brics)”, diz Mansour.