São Paulo – Se a ascendência direta de Fred Caffarena é italiana, seu propósito de vida já é de outra região do globo. O chef paulista se especializa na gastronomia do Oriente Médio. Assim mesmo, no presente, porque com mais de oito anos de experiência e viagens a diferentes países da região, ele continua estudando. “Sempre fui muito apaixonado por história. E toda vez que tenho um tempo, eu estou com livros sobre a história dessas gastronomias. Eu falo que passei mais tempo estudando história do que, de fato, na cozinha”, contou ele à ANBA.
No currículo, ele tem um ano morando, trabalhando e estudando gastronomia na Turquia, entre 2013 e 2014. Lá o brasileiro percebeu na prática como as cozinhas da região intercambiaram criações e ingredientes, influenciando-se mutuamente. “Você sempre teve as trocas de cultura. Um grande polo produtivo de refinamento nós temos na gastronomia do Levante. Principalmente Líbano e Síria. Damasco foi um dos maiores ‘palácios’ que existiram. Tanto que muito da cozinha turca de palácio tem muito de Damasco”, explicou o chef sobre o processo cultural que gerou a cozinhas como a turco otomana.
Caffarena também já viajou e bebeu da fonte culinária do Líbano, Marrocos, Emirados Árabes Unidos e Síria. A bagagem levou o brasileiro a empreender em três negócios diferentes, todos voltados para gastronomia do Oriente Médio. Em um dos pontos, o Kebab Salonu, ele é sócio. Já no Firin Salonu e no mais novo ‘Make Hommus. Not War’, além de sócio é também quem comanda a cozinha.
A casa principal, Firin Salonu, teve os serviços pausados durante a quarentena. “Eu quero que o Firin mude a percepção do brasileiro sobre o que é gastronomia árabe e do Oriente Médio. Para fazer tudo isso, eu não posso só mandar o prato sem contar o que está por trás, o porquê, que o prato é feito só com técnicas do Oriente Médio. Como agora não temos essa lida com o cliente, essa experiência, acho que isso se perderia”, explicou Caffarena. Daí surgiu a necessidade de acelerar um projeto diferente.
Adeus estereótipos
Com a sócia, Talita Silveira, o chef abriu a Make Hommus em plena pandemia. Aliás, a inauguração foi no Dia Internacional do Homus, em 13 de maio. “Quando falamos de comida árabe, as pessoas tendem a focar somente na gastronomia sírio libanesa, que já é uma generalização, e em produtos-chave”, lembrou o chef, que na passagem pelo Líbano encontrou diferentes realidades. Se em Beirute foi difícil encontrar restaurantes tradicionais, a cidade portuária de Byblos trouxe descobertas como o kibe de peixe.
Os estudos e vivências levaram Caffarena a redescobrir constantemente as diferentes gastronomias árabes. “Quando estruturei o Make Hommus e o Firin, eu coloquei tudo isso [estereótipos] de fora e montei todo um trabalho de pesquisa, buscando ingredientes. Claro que estou no Brasil então tenho que usar coisas daqui para ser sustentável, mas eu utilizo muito da filosofia e das técnicas que são feitas lá. Por exemplo, quando eu fui ao Marrocos eu fiz questão de ver como é feito o cuscuz”, destacou o chef, detalhando passo a passo do processo que conheceu in loco.
Make um homus com diversas técnicas
E, para confrontar, inclusive, a ideia de origem única de pratos, o brasileiro deixa claro já no nome de sua casa de homus que o ingrediente está acima de disputas. ‘Make Hommus. Not War’, faz alusão ao fato de que a pasta de grão de bico é um ícone em países árabes e em outros da região do Oriente Médio. Mas, afinal, de quem é a propriedade? “Tem um historiador britânico que diz que isso é besteira, porque você não vai encontrar uma origem precisa. Por muito tempo, eu também fiquei tentando entender quem era o povo que criou tal prato. Você consegue ver os indícios de onde isso pode ter surgido, mas é um caldeirão cultural”, afirma ele, lembrando das modificações pelas quais as receitas passam ao longo da história e da contribuição que diferentes povos dão a ela, especialmente um uma região antiga como o Oriente Médio.
A mistura cultural é vista, inclusive, na receita do homus desenvolvida pelo chef. “Minha receita é vasta. Eu estudei técnicas e ingredientes usados no Iêmen, Líbano e Síria, então fiz um compilado dessas receitas e técnicas”, revelou. A casa especializada, claro, na pasta de grão de bico, serve também produtos como o kibe de receita levantina e um pão do Irã.
Na foto no topo da matéria, está um dos pratos servidos na casa. O ‘Hommus tradicional com linguiça de cordeiro’, levemente apimentada na brasa, que leva também ovo, tomate assado e cebola com sumak.
Outra iguaria vem do Golfo. É o Loomi, ou noomi basra, uma “especiaria” que é feita com um limão seco e fermentado e que pode ser usado para aromatizar pratos e preparar infusões. “Você o encontra nos Emirados Árabes, no Iêmen, no Catar, na Arábia Saudita, no Irã. Ele é dessa região muito quente. Eles pegam o limão fermentam e deixam no calor do deserto para secar. Lá ele fica até secar e ficar preto. E usam para fazer chá ou como especiaria”, relatou.
Para tentar reproduzir as condições do processo do loomi, o chef descobriu a média de temperatura e umidade no Deserto do Saara. A partir daí, a busca foi por repetir as condições no restaurante. “Tentamos simular as mesmas condições no forno, colocamos para desidratar e ficou muito bom. É claro que o de lá ainda é melhor, mas nós vamos chegar lá”, concluiu Caffarena.
O caminho que o brasileiro trilha com seus restaurantes é para realizar um objetivo. “Eu tenho o sonho de mostrar que a comida árabe vai muito além dos estereótipos que temos aqui no Brasil. É muito diverso. O Marrocos, por exemplo, é incrível, tem um tom muito diferente do Levante. Quero visitar todos os países árabes. E quero que o Firin seja um meio para mudar a percepção do que é a gastronomia árabe”, afirmou Caffarena. No momento, a Make Hommus. Not War segue focando em delivery, o Firin Salonu, que existe desde 2015, aguarda o fim da pandemia para poder retomar as atividades, e o chef tem, ainda, outros projetos. “Mas esses são para o futuro”, disse.
Serviço
Make Hommus. Not war
Almoço – terça a sexta das 11h às 14h30/ sábados das 12h às 16h
Jantar – quarta a sexta das 18h às 22h / sábados das 19h às 22h
Pedidos pelo aplicativo iFood ou WhatsApp (11)3864-8295