Isaura Daniel
São Paulo – O município de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, vai se transformar em um pólo de fabricação de navios petroleiros dentro de pouco mais de um ano. A cidade receberá dois estaleiros de grande porte, o norueguês Aker-Promar, que já possui uma unidade em Niterói, no Rio de Janeiro, e o "Rio Grande", projeto de três empresários brasileiros, um dos quais proprietário do estaleiro fluminense Transnave.
Os dois grupos devem iniciar as obras entre fevereiro e março do próximo ano. Os sócios do estaleiro Rio Grande negociam, inclusive, o aporte de investimentos estrangeiros no negócio. O gerente de implantação do estaleiro, Roberto Dieckmann, não revela os nomes dos envolvidos, mas afirma que são duas companhias internacionais que ainda não têm presença no Brasil. Os sócios brasileiros são Maurício Carvalho, Daniel Birmann e Raimundo Pessoa.
Os estaleiros serão construídos na área do Porto de Rio Grande para atender à demanda da indústria petrolífera. A Aker-Promar vai fabricar navios petroleiros, com cerca de 250 a 280 metros de comprimento, e também plataformas móveis para exploração de petróleo. A empresa planeja produzir quatro embarcações por ano. A primeira entrega deve ser feita no final de 2006. O investimento, porém, ainda está pendente da confirmação, pela Petrobras, de uma encomenda de 22 navios ao mercado, o que deve ocorrer nas primeiras semanas de novembro.
O estaleiro Rio Grande pretende fabricar três petroleiros ao ano, com uma média de 270 metros de comprimento. De acordo com Dieckmann, atualmente os estaleiros do Rio de Janeiro, onde está concentrada a indústria naval brasileira, não estão fabricando navios petroleiros, o que poderá transformar o município gaúcho no único pólo da área.
A própria Aker-Promar produz apenas navios com até cem metros de comprimento na sua unidade em Niterói. A empresa pretende investir, no total, US$ 150 milhões no novo empreendimento, que vai ocupar uma área de 300 mil metros quadrados.
Já o Rio Grande planeja aplicar R$ 90 milhões somente nas obras de construção de sua planta, em uma área de 560 mil metros quadrados, e começará a fazer as primeiras entregas no início de 2008, de acordo com Dieckmann. As duas empresas vão pedir financiamentos ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Mercado externo
Os empreendimentos devem atender o mercado nacional, principalmente a Transpetro, braço operacional de transporte da Petrobras, mas não descartam a exportação de navios. A Aker, inclusive, já vende suas embarcações no mercado internacional. A unidade fluminense, que tem 51% de capital norueguês, fabrica uma média de quatro navios ao ano. O volume de vendas externas varia de acordo com a demanda.
Nos demais países, porém, as empresas vão encontrar a concorrência dos fabricantes asiáticos, que detêm grande parte do mercado naval mundial. "Acredito que em cinco ou seis anos já possamos disputar o mercado externo", diz Roberto Dieckmann.
Entre 10 e 15 outras empresas devem se instalar no município gaúcho para trabalhar como fornecedoras dos estaleiros, de acordo com o diretor-superintendente do Porto de Rio Grande, Vidal Áureo Mendonça. Apesar de alguns componentes dos navios, como motores e bombas, serem importados, outros produtos, como aço e tintas, normalmente são adquiridos no mercado interno.
A chegada dos estaleiros também vai beneficiar o porto. "(Os empreendimentos) vão qualificar tecnicamente o porto, pois as embarcações poderão parar aqui para fazer consertos. Entre Buenos Aires (Argentina) e o Rio de Janeiro não existem hoje estaleiros em condições de atender as embarcações, e isso será um diferencial", diz Mendonça. O estaleiro Rio Grande também vai trabalhar com conserto de embarcações.
Rio Grande é o segundo porto com maior movimentação de contêineres do Brasil e o principal pólo exportador de maquinário agrícola. Nos oito primeiros meses deste ano, foram movimentados 15,2 milhões de toneladas no local, com crescimento de 3% sobre o mesmo período de 2003. Entre as principais mercadorias embarcadas no porto estão os produtos agrícolas, óleo e farelo de soja, tratores e colheitadeiras e automóveis.
No ano passado inteiro, passaram pelo porto 21,5 milhões de toneladas, um recorde histórico que, de acordo com Mendonça, deve ser superado em 2004. O porto já movimenta produtos da indústria do petróleo, em função da presença da refinaria e distribuidora Ipiranga e de uma distribuidora da Petrobras no município. A partir de 2005, porém, deve aumentar o volume de petróleo embarcado, já que a Petrobras deverá começar a explorar a Bacia de Pelotas, na Costa Sul do Rio Grande do Sul.
Os dois novos estaleiros serão construídos em uma área cedida pelo porto, que é de propriedade da União, mas administrada pelo governo do estado.
Impacto econômico
A chegada dos estaleiros deve mudar significativamente a rotina do município de Rio Grande. Espera-se que serão gerados cinco mil empregos diretos e 20 mil indiretos com a instalação das duas indústrias navais. Para uma população economicamente ativa de 55 mil pessoas, 31 mil delas já trabalhando com carteira assinada, os estaleiros terão um impacto grande em número de vagas disponíveis. O município tem uma população de 193 mil pessoas.
Os estaleiros deverão contratar desde engenheiros até soldadores, eletricistas e técnicos em eletrônica e atrair mão-de-obra de todo o estado. De acordo com o secretário municipal de Coordenação e Planejamento, Neverson Ribeiro Moraes, o município já está em contato com institutos técnicos para treinar a mão-de-obra, em parceria com a Fundação Universidade Federal de Rio Grande (Furg). "Hoje não temos um pólo de mão-de-obra pronto para receber as empresas", diz.
Grandes redes de varejo, como Casas Bahia e Magazine Luiza, também mostraram interesse em se instalar na cidade após o anúncio do projeto, de acordo com Moraes. O município tem um Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 2,5 bilhões e está entre as dez principais economias do Rio Grande do Sul. A atividade econômica está ligada principalmente ao setor de serviços, em função do porto, e também à indústria e à pesca.
Além das duas empresas da área de petróleo, Rio Grande abriga quatro fábricas de fertilizantes, duas esmagadoras de soja, um terminal de grãos com capacidade para armazenar 12 milhões de toneladas (no porto) e duas universidades, a Furg, que é pública, e a Atlântico Sul, particular. No momento, o município possui apenas um pequeno estaleiro de reparação de navios.