São Paulo – O que o Egito trouxe para o modernismo brasileiro? Muita coisa, descobriram os curadores da exposição “Desvairar 22”. Em cartaz no Sesc Pinheiros, na capital paulista, até 15 de janeiro de 2023, a mostra traz mais de 270 itens, desde sarcófago de 3000 a.C., fotos da expedição de D. Pedro II ao Egito até “Allah-La Ô” e É o Tchan. Em meio a isso, obras de modernistas, como Tarsila do Amaral e Mario de Andrade, entre artistas de novas gerações.
A mostra comemora o centenário da Semana de Arte Moderna, que ocorreu em 1922 no Theatro Municipal de São Paulo e transformou a cultura brasileira, e o Bicentenário da Independência do Brasil. Com entrada gratuita, ela traz artes visuais, música, literatura e arquitetura divididos em quatro núcleos.
Desde 2019, Marta Mestre, Veronica Stigger e Eduardo Sterzi trabalharam na curadoria da exposição. “Foi um insight da Marta. Tudo surge do fato do Dom Pedro II ter viajado ao Egito, quando trouxe muitas coisas, inclusive múmias e tesouros. Ele era uma personalidade antenada e é interessante, percebemos que nessa viagem já se formava essa imaginação do que era o Egito. Uma imagem de um lugar outro, de outra possibilidade de vida e experiência”, revelou ela.
Mas outra expedição também marca a construção da mostra. “Outra coisa que a Marta trouxe foi a viagem que na década de 20 alguns dos modernistas vão fazer ao Egito, como Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade. E lá a Tarsila do Amaral faz um álbum em que traz uma série de recortes e desenhos que faz. E alguns deles servem de base para a pintura que abre a exposição, que é a Calmaria II. Ali vemos já uma determinada de ‘Egito’ flagrada em uma geometrização das formas”, contou Stigger em entrevista à ANBA.
De sarcófago ao É o Tchan
Para a curadora, a imagem do Egito não para nas pinturas, se desdobrando em literatura e música. “No livro ‘O Homem e a Morte’ [de Menotti del Picchia], por exemplo, um dos personagens é um arquiteto que quer construir uma esfinge”, disse ela. Outro exemplo é uma charge da cartunista Laerte, em que esfinge pede: “decifra-me outra hora”.
A exibição traz, ainda, outros fatos emblemáticos que giram em torno de 1922, como a descoberta da tumba de Tutancâmon e a primeira transmissão de rádio no Brasil. Esse caminho de influências segue com o espaço expositivo ao som de “Alalaô” (“Allah-lá-ô”), marchinha do Carnaval de 1941, além da frase “Está fundado o desvairismo”, de “Paulicéia Desvairada”, de Mário de Andrade.
No centro da exposição está uma das peças mais procurada pelos visitantes, um sarcófago original, cedido à exposição pelo Museu da Universidade de São Paulo. Outro original é um vaso canópico, objeto que era utilizado para guardar órgãos retirados dos corpos que seriam mumificados.
Outras obras estão espalhadas pelos núcleos, como o primeiro batizado de “Saudades do Egito”. Ali estão fotos da expedição que Dom Pedro II fez ao Egito na década de 1870, jornais da época destacando a descoberta da tumba de Tutancâmon e fotos de Marcel Gautherot da arquitetura “faraônica” de Brasília. Há, ainda, a inspiração do Egito em obras como a ópera Aida, em músicas de Margareth Menezes e Jorge Ben Jor e em videoclipe do grupo É o Tchan. Além disso, as raízes negras do país africano também são ressaltadas no núcleo em obras como de Abdias do Nascimento.
Na seção “Os Ossos do Mundo” há, ainda, figuras que remetem às múmias em obras como a de Cristiano Leenhardt. E até o mosquito Aedes aegypti, originário do Egito, está em telas como a de Oswald de Andrade Filho. Já no núcleo “Meios de Transporte”, há registros como da passagem do dirigível Graf Zeppelin pelo Brasil nos anos 1930 e de um bonde empacado fotografado por Mário de Andrade. Por fim, “Índios Errantes” traz obras de artistas como Anna Maria Maiolino, Carybé, Lygia Pape, Paulo Nazareth e Regina Parra.
Além do trabalho coletivo, o trio de curadores convidou, ainda, os carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora, da Acadêmicos do Grande Rio, para colaborarem na mostra. “Tivemos a ideia de ter o carro alegórico, e convidamos Gabriel e o Leonardo, que inclusive ganharam o carnaval [do Rio de Janeiro] deste ano. Como o carro alegórico é enorme, eles propuseram levar a parte superior do último carro que aparece na avenida, e que tem sete exunautas, uma mistura de Exu com astronauta. E quem vai até a varanda, vê que eles estão olhando para o alto, para o além”, conclui ela.
A instalação “Exunautas” está na varanda do espaço e encerra a mostra, que contempla a ação em rede “Diversos 22: Projetos, Memórias, Conexões”, desenvolvida pelo Sesc São Paulo.
Serviço
Exposição “Desvairar 22”
Visitação até 15 de janeiro de 2023
Terça a sábado, das 10h30 às 21h | domingos e feriados, das 10h30 às 18h
Sesc Pinheiros – Endereço: Rua Paes Leme, 195, Pinheiros, São Paulo, SP
Entrada gratuita