Isaura Daniel
São Paulo – Para chegar até os consumidores árabes, a maioria das empresas brasileiras tem pela frente um desafio: a concorrência com a China. Há muito tempo que os chineses descobriram o poder de compra do mundo árabe e desembarcaram por lá com suas mercadorias.
Só com os Emirados Árabes Unidos, a China teve, no ano passado, um comércio de US$ 8 bilhões, valor similar à corrente comercial do Brasil com as 22 nações da Liga Árabe. Os países do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC), que são Bahrein, Kuwait, Catar, Omã, Arábia Saudita e Emirados, absorvem 2% das exportações chinesas, de acordo com a agência de notícias árabes Ameinfo.
Os setores de têxteis, calçados, eletrônicos, materiais de construção, móveis e autopeças são alguns dos quais onde os produtos chineses estão mais presentes no mundo árabe, segundo o secretário-geral da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Michel Alaby.
"Nos setores em que não há necessidade de alta tecnologia, nos quais a produção é de escala e precisa de muita mão-de-obra, eles saem na frente", afirma Gerson Schmitt, diretor de marcas e canais de vendas da Dilly, fabricante dos calçados esportivos Try On e de marcas internacionais como Nike, Puma e Fila no Brasil. A Dilly fabrica cerca de 7,5 milhões de calçados por ano e exporta os produtos Try On para o mundo árabe.
O setor de calçados é um dos que mais enfrenta a concorrência com as fábricas asiáticas no mundo árabe. De acordo com Schmitt, os calçados chineses chegam ao mercado árabe com preços entre 10% e 30% menores do que os similares brasileiros.
A China tem custos baixíssimos de mão-de-obra e uma política exportadora agressiva. "Eles são pró-ativos no comércio internacional", diz Fahd Koja, gerente-geral da Giro Group, empresa de exportação que trabalha com o mercado árabe. Os chineses também estão mais próximos do Oriente Médio. "Eles têm um custo de frete menor em função da geografia", lembra Koja.
As fábricas da China, no entanto, costumam trabalhar apenas com larga escala. "Eles não são bons em lotes menores e nós produzimos lotes menores", diz o diretor da Dilly. Segundo o executivo, esse é um fator pelo qual a empresa costuma tirar vantagem ao vender no mundo árabe. Os pedidos menores trazem menos risco ao importador pois, caso o produto não seja bem aceito ou apresentar algum problema, a reposição será mais fácil e ágil. Também não há altos custos de estoque.
A China ainda leva consigo também o estigma da baixa qualidade. Entre os empresários brasileiros é unânime: a grande vantagem do Brasil, na concorrência com a China, é a qualidade e a criatividade. "O Brasil pode fugir da concorrência com os chineses com qualidade, diferencial de design e marca", afirma Michel Alaby. O gerente-geral da Giro Group reforça a idéia. "É preciso criar um diferencial para o produto. Pode ser, por exemplo, a embalagem, uma apresentação diferente", diz Koja.
O diretor de marcas e canais de vendas da Dilly acredita que a criatividade é um quesito que tem aberto mercado para a empresa no mundo árabe. "Competimos com capacidade de inovação", diz Gerson Schmitt. A marca Try On se especializou em adventure. Os calçados são inspirados nas características da natureza brasileira.
Móveis da China
Um dos segmentos em que a China mais cresce no mercado árabe é o de móveis. "Existe uma evolução moveleira grande na China. Nós percebemos isso nas feiras internacionais. Os chineses não eram tão presentes há cinco anos", afirma o presidente da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (Abimóvel), Domingos Sávio Rigoni.
A principal concorrência, no setor, ocorre na área de móveis maciços, onde há uma necessidade maior de mão-de-obra. "Mas eles estão em todos os segmentos", diz o presidente da Abimóvel. De acordo com Rigoni, nas áreas que demandam produção mais automatizada a competição também existe, mas é um pouco menor. O presidente da Abimóvel afirma que o design é, também, no segmento de móveis, o fator pelo qual o Brasil tem garantido mercado no exterior frente aos chineses.
China de todo dia
O avanço da China no mundo árabe pode ser percebido por meio das notícias locais. Diariamente a imprensa árabe publica matérias com anúncios de joint-ventures e aumento de exportações chinesas. No mês de outubro, por exemplo, a estatal chinesa de construção Cino Hydro assinou um memorando de intenções para construir uma fábrica de cimentos em Damasco, na Síria.
A China tem negócios em diversos segmentos no mundo árabe, mas um dos seus grandes interesses é o petróleo. "A China tem preocupação de garantir fontes de energia", diz o secretário-geral da Câmara Árabe. Vários países árabes têm parcerias com a China no setor petrolífero. Companhias chinesas como a China Petrochemical Corporation (Sinopec) e a China National Petroleum Corporation, por exemplo, estão instaladas no Egito. A Sinopec venceu, inclusive, no ano passado, uma licitação para explorar gás natural na Arábia Saudita.
O maior parceiro comercial chinês, no mundo árabe, é a Arábia Saudita, seguida dos Emirados. Nos Emirados Árabes Unidos existem 500 companhias chinesas instaladas, de acordo com a Ameinfo. No mês de setembro deste ano, os países árabes assinaram, por meio da Liga Árabe, um acordo para aumentar ainda mais a cooperação e o diálogo comercial com a China.