São Paulo – O movimento por um mundo mais sustentável chegou às rodovias brasileiras. Nos últimos sete anos, 2,2 mil quilômetros de estradas foram recapeados no País com asfalto ecológico, feito a partir de pneus reciclados. A extensão significa apenas 2,43% da malha rodoviária nacional pavimentada, mas a disposição dos operadores das estradas, que a cada ano colocam o produto em novos trechos, mostra que a iniciativa pode chegar bem mais longe. O benefício para o globo? Menos borracha velha jogada ao léu e menos trabalho para a natureza, que leva cerca de 150 anos para fazer um pneu se decompor.
Do total de rodovias feitas com asfalto ecológico no País, 443 quilômetros foram concluídos no ano passado, de acordo com informações da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR). Em 2010, foram 340 quilômetros e, no ano anterior, 290 quilômetros ganharam asfalto verde. E assim, de pedacinho em pedacinho, a borracha foi e vai tomando conta da via.
"Estamos deixando de colocar 450 mil a 500 mil pneus na natureza", afirma o coordenador de obras da CCR AutoBAn, Gustavo Anfra, sobre as obras que a empresa vem fazendo nas rodovias que tem concessão.
A CCR Autoban terminou em abril o recapeamento 180 quilômetros com asfalto de borracha na Bandeirantes. Também usou o produto em 200 quilômetros da Anhanguera e está trabalhando em outros 94 quilômetros na mesma estrada. Ambas as rodovias ligam a capital ao interior do estado de São Paulo.
De acordo com Anfra, a empresa optou pelo asfalto emborrachado por causa da questão socioambiental. O produto, porém, também tem melhor desempenho que o asfalto tradicional. O ruído da fricção com os pneus dos carros é menor, o spray de água que o automóvel da frente joga no de trás também é reduzido e o pavimento aplicado pode ser mais fino, já que a qualidade da mistura é maior.
Mas, principalmente, o asfalto ecológico é mais durável. "A vida útil é 30% maior em relação ao convencional. O convencional dura cinco a seis anos e esse dura de oito a dez anos", relata Anfra. De acordo com o coordenador de obras da CCR AutoBAn, como a pavimentação com borracha é mais resistente, é preciso fazer menos intervenções e isso gera menos transtorno na rodovia. Por outro lado, o asfalto ecológico é cerca de 40% mais caro. "É um pouco mais caro, mas vale a pena investir pensando no meio ambiente", afirma ele, fazendo a soma dos custos e benefícios, como durabilidade, etc.
O grupo EcoRodovias investe no asfalto de borracha desde 2002. Segundo informações da empresa, o produto já está em mil quilômetros operados por cinco das suas controladas, o que representa cerca de 20% dos trechos sob sua concessão. O uso começou no Sistema Anchieta-Imigrantes, em caráter de teste, e depois de comprovada a eficácia, a concessionária resolveu usá-lo em larga escala. As rodovias Anchieta e Imigrantes ligam a cidade de São Paulo ao litoral.
"O asfalto borracha é cerca de 40% mais resistente que o produto convencional em função da adição de borracha de pneus à massa asfáltica", informa a empresa, ao falar dos motivos que a levaram a optar pela nova tecnologia.
A EcoRodovias também cita, entre as razões da escolha, o menor ruído, a aderência que diminui possibilidade de derrapagens e reduz o spray, além da preservação do meio ambiente. De acordo com a empresa, para pavimentar um quilômetro são reaproveitados cerca de 600 pneus. "Considerando apenas sua aplicação no Sistema Anchieta-Imigrantes, desde que passou a ser usado em larga escala, o asfalto de borracha já foi responsável pelo reuso de 360 mil pneus", informa a companhia.
Mas a EcoRodovias quer ainda mais. Ela está fazendo testes, em sua própria usina da área, de um novo produto chamado Mistura Morna. Sem revelar muitos detalhes, a empresa afirma que a técnica, que também usa pneus, reduz o consumo de combustível da usina e, principalmente, a emissão de gás carbônico no meio ambiente.
A EcoRodovias inaugurou em 2005 sua usina responsável pela fabricação de asfalto de borracha. O empreendimento tem capacidade para 140 toneladas por hora e opera com o apoio de um laboratório para garantir a qualidade e a vida útil do produto. Mas a iniciativa da EcoRodovias, de fabricar seu próprio asfalto, não é tão comum assim, já que boa parte das concessionárias compra o asfalto de borracha de fornecedores, como a Petrobras Distribuidora e a Grecca Asfaltos.
O que é?
O asfalto ecológico nada mais é que a mistura de Cimento Asfáltico de Petróleo (CAP) ao pó de borracha feito a partir de pneus triturados, segundo explicação do consultor da gerência de comercialização de Asfalto da Petrobras Distribuidora, Ilonir Tonial. Já o pavimento asfáltico tradicional é uma mistura do CAP com pedra brita. Essa mistura, quente, é levada para a superfície da estrada. De acordo com as condições do solo, será necessário colocar saibro, ou pedra brita, antes deste pavimento. Toda essa composição, porém, seja com borracha ou sem, deve feita segundo as necessidades da rodovia, entre elas o fluxo que vai receber, peso, solo, etc.
A Petrobras Distribuidora começou a comercializar o asfalto de borracha em 2001 e, de acordo com Tonial, a procura vem aumentando. O futuro da demanda, porém, ele acredita que vai depender muito do fator econômico. O consultor afirma que aspecto ecológico é importante, já que a sua fabricação elimina um resíduo da indústria automobilística, mas o preço também pesa muito para o mercado. Quando, por exemplo, insumos importados (do CAP), ligados ao petróleo, ficam mais caros, o asfalto de borracha se torna mais atrativo. Ele não descarta que surjam novos produtos, com performance melhor, para disputar esse mercado.
O asfalto de borracha, apesar de dar sua contribuição ao meio ambiente, representa uma parcela pequena no universo do reaproveitamento de pneus no Brasil. A Reciclanip, organismo que atua na coleta e distribuição para reuso de pneus inutilizados, coletou 89 mil toneladas no primeiro trimestre deste ano. Se esse material todo fosse transformado em matéria-prima para asfalto ecológico, daria para recapear 18 mil quilômetros. O reuso dos pneus, no País, se estende desde a fabricação de pisos de quadras esportivas, tapetes para carros e solados de borracha, até geração de combustível para indústrias de cimento. Essa última tem maior demanda.