Isaura Daniel
São Paulo – Tudo começou na década de 20. A cidade de São Paulo tinha então cerca de 580 mil habitantes, a cultura do café enfrentava uma das suas crises e várias indústrias abriam suas portas. Foi nesse ambiente que no dia 28 de novembro de 1921 uma libanesa que morava na capital paulista, chamada Adma Jafet, convidou as amigas para um encontro na sua casa, no bairro do Paraíso. Não era, porém, apenas mais um chá de senhoras. Adma, que chegou no Brasil aos 15 anos, tinha uma proposta: a construção de um hospital.
As amigas gostaram da idéia e naquele dia mesmo fizeram doações que somaram 200 contos de réis. Pouco depois o grupo de 27 integrantes da comunidade sírio-libanesa, todas mulheres, tinha criado a Sociedade Beneficente de Senhoras do Hospital Sírio-Libanês. Após vários chás beneficentes, de convocar maridos e amigos para ajudar na tarefa, e principalmente, de muita dedicação, foi aberto, em 1965, o Hospital Sírio-Libanês, atualmente uma referência em atendimento hospitalar no Brasil.
"Minha mãe era muito inteligente, estava cem anos à frente", diz Violeta Jafet, filha de Adma e atual presidente da Sociedade Beneficente. Ontem, Violeta, juntamente com um grupo de senhoras que integra o grupo, participou de uma homenagem à Adma e ao seu marido, Basílio Jafet, já falecidos, no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês. Foi descerrada uma placa em homenagem ao casal e outra ao ginecologista Pedro Camasnie, de 92 anos, o mais antigo médico do Hospital, que integrou o primeiro grupo de médicos clínicos e o primeiro conselho técnico administrativo da instituição.
As duas homenagens fizeram parte do início das comemorações dos 85 anos da Sociedade Beneficente. Também foi lançado um selo adesivo sobre a data que será utilizado em correspondências do Hospital Sírio-Libanês, publicações internas, intranet e laudos médicos. O selo mostra o símbolo do hospital, que é a figura de uma enfermeira ao lado de uma cruz radiante e foi inspirado em um logotipo feito pela própria Adma Jafet para a Sociedade Beneficente. Até o dia 28 de novembro deste ano uma série de iniciativas parecidas a esta marcará a comemoração.
Comemoração
De acordo com o superintendente da instituição de saúde, Maurício Ceschin, também entrará no ar, no final deste mês, uma nova versão da página do Hospital na internet, nos idiomas português, espanhol, inglês e árabe, e será lançado um livro sobre os 85 anos da fundação da Sociedade Beneficente. Atualmente, o site da instituição tem versão em português e inglês. Também vai ser inaugurado um novo memorial, que terá relatos da história do hospital no Instituto de Ensino e Pesquisa do Sírio-Libanês. Hoje existe um memorial, mas que fica nas instalações do Hospital.
A Sociedade Beneficente das Senhoras é ainda a mantenedora do Hospital Sírio-Libanês, que funciona atualmente em 54 mil metros quadrados, tem 40 tipos de especialização, 300 leitos e 2.700 funcionários. A instituição conta com 1.200 médicos e, segundo Ceschin, realiza ao redor de cinco mil atendimentos ao mês. O Sírio-Libanês é reconhecido principalmente em função do trabalho com pacientes de alta complexidade, em áreas como oncologia, cardiologia e neurologia.
Saúde para todos
Uma das atividades desenvolvidas, das quais o grupo de senhoras fundadoras costuma se orgulhar, é a filantropia. A Sociedade Beneficente mantém, por exemplo, o Ambulatório de Pediatria Social, que atende por mês cerca de 800 crianças carentes do bairro da Bela Vista, onde o Hospital está instalado. Ele foi criado há sete anos. Também oferece aos moradores do bairro atividades de capacitação profissional, culturais e esportivas em um prédio anexo ao Hospital Sírio-Libanês, dentro do projeto "Abrace seu Bairro".
"Conseguimos materializar um grande ideal, ajudar crianças carentes que não possuíam meios de se tratar. Eu faria tudo de novo", disse ontem Violeta Jafet. A descendente de libaneses já estava à frente da Sociedade Beneficente quando o Hospital foi inaugurado, em 1965, já que sua mãe, Adma, faleceu antes disso, em 1956. "A continuidade desta obra tem a mão e o coração da minha avó Violeta", disse o neto de Violeta, Basílio Jafet Neto, que falou em nome da avó ontem, na homenagem. Violeta já está com 98 anos.
Além do trabalho feito pela família Jafet em prol do Hospital Sírio-Libanês, também foi lembrada, na homenagem de ontem, a dedicação de Pedro Camasmie à instituição. Camasmie, também descendente de libaneses, nasceu em São Paulo, em 1913, e formou-se em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP). Ele trabalha no Hospital há 41 anos e apesar da idade avançada, ainda atua na instituição. Camasmie também ajudou a fundar o Sanatório Sírio de Campos do Jordão. "Sua vida está imbuída do que caracteriza o Hospital: a filantropia", falou ontem o diretor clínico do Hospital, Dário Birolini, na homenagem.