São Paulo – Foi durante o processo de reconexão com a origem síria que o ator carioca Mouhamed Harfouch, de 47 anos, criou o espetáculo “Meu remédio”. O monólogo estreia no dia 10 de janeiro de 2025 no palco do Teatro Ipanema, no Rio de Janeiro, e terá duração de 1h10.
“A premissa do meu espetáculo é que todo nome guarda uma história e será a partir do meu nome que vou apresentar a minha história no teatro. No processo de criação da peça, cheguei à conclusão de que um nome nunca é só um nome, é uma caminhada, é algo que fala de toda sua ancestralidade”, diz Mouhamed.
Filho do meio de um sírio e de uma brasileira, o ator vai falar sobre a história do pai e da influência árabe na sua carreira na televisão.
“Conforme fui crescendo, convivia com meus amigos ocidentais e com minhas origens árabes. Quando via meu pai falando árabe com os parentes que moram na Síria sempre me pareceu algo mágico, místico. Com o passar do tempo fui me encontrando mais com as minhas origens e isso foi gerando um sentimento de pertencimento. E hoje quero contar minha história para poder valorizar a cultura árabe.”
Antes de criar esse monólogo, Mouhamed, que conta com 30 anos de experiência como ator, já tinha vivenciado experiências profissionais que o aproximaram das suas origens.
“Foi em 2006 na novela ‘Pé na Jaca’ que vivi meu primeiro personagem árabe, o Houssein”, diz. O ator tinha pela frente falar com sotaque árabe. “Como nunca tinha feito, achei que sairia ruim, mas tentei e imitei o meu pai e no final ficou ótimo”, relembra o profissional.
Depois deste primeiro papel, Mouhamed ainda interpretou outros três personagens árabes na TV Globo: o Farid em ‘Cordel Encantado’ em 2011, o Pérsio na novela ‘Amor à vida’, que foi ao ar em 2013, e após seis anos viveu Ali, seu mais recente personagem árabe em ‘Órfãos da Terra’.
“Para mim foi muito importante e significativo ter tido a oportunidade de interpretar esses personagens. Para os árabes que moram aqui no Brasil acho que ver um personagem assim em uma novela da Globo é a chance de poder se sentir representado, de trazer proximidade com o próximo”, explica Mouhamed.
“Esses personagens também se tornam formas de apresentar a cultura árabe para quem não conhece e de alguma maneira ajudam a combater o preconceito de quem não sabe como são os árabes.”
Influência árabe desde a infância
Foi entre as décadas de 1960 e 1970 que o pai de Mouhamed chegou ao Brasil. Jovem, sozinho e sem saber falar a língua do país, Nadim Harfouch acabou exercendo diversas profissões, entre elas feirante e camelô, para conseguir mandar dinheiro para a família que vivia na Síria.
“Após alguns anos, ele conheceu minha mãe e passou a trabalhar como corretor de imóveis. Quando olho para trás e vejo como meu pai foi corajoso, fico muito orgulhoso, porque naquela época não havia tantas oportunidades como agora, por isso ele precisou se esforçar muito para dar certo no País”, diz o ator.
“Assim como ele precisou batalhar muito quando chegou no Brasil, também precisei quando decidi me tornar ator, sem influência ou ajuda de ninguém. Me espelhei muito na coragem dele para trilhar meu caminho.”
Por muitos anos, mesmo sem perceber, as origens árabes estavam presentes em diversos momentos da sua vida. “Meu pai falava árabe em casa com bastante frequência e sem perceber acabei aprendendo a entender várias palavras. Falar eu não consigo, mas entendo um pouco dessa língua super complexa. E esse sotaque acabou se infiltrando na minha profissão”, conta Mouhamed.
Além da linguagem, a música e a culinária árabes também faziam parte do dia a dia do carioca. E para que essa tradição não se acabe nele, Mouhamed decidiu repassar para os dois filhos.
“Os pratos árabes que a minha mãe fazia para mim quando criança, hoje faço para os meus dois filhos comerem. Eles adoram música árabe e meu filho mais novo, Bento, copia, sem querer, trejeitos que eu vi o meu pai fazendo”
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Reportagem de Rebecca Vettore, em colaboração com a ANBA.