São Paulo – Na próxima sexta-feira (20) os muçulmanos que vivem no Brasil, assim como em outras partes do mundo, mudam a sua rotina para viver o seu mês do jejum. É o começo do Ramadã, nono mês do calendário lunar, período sagrado para os muçulmanos. Estando dentro ou fora de um país islâmico, eles têm por obrigação, neste período, realizar um jejum completo desde o momento em que o sol nasce até a hora em que ele se põe.
No Brasil, o Ramadã fica ainda mais visível para quem tem conhecidos muçulmanos e para quem vive perto das mesquitas. Nelas há um grande calendário com orações conjuntas, celebrações, palestras e até jantares para quebrar o jejum de forma coletiva depois que o sol se vai. Nas casas de islâmicos costumam ser feitos encontros de famílias e amigos, com várias opções de comida, para uma alimentação comum depois de horas sem comer ou beber.
"O Ramadã é um mês importante para todos os muçulmanos. É um pilar do Islam jejuar no Ramadã", diz o xeque Khalid Taky El Din, diretor de assuntos islâmicos da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (Fambras). A religião islâmica é constituída de cinco pilares. Além do jejum no Ramadã, há ainda a fé, a oração, a caridade e a peregrinação. "Fazer o bem neste mês multiplica o benefício. Uma doação vale por 70 doações, uma oração vale por 70 orações", explica o xeque.
De acordo com a crença islâmica, foi no mês do Ramadã que Deus revelou o Alcorão ao profeta Mohammad. Para os muçulmanos, a “Noite do Decreto”, data em que Deus fez a revelação do livro sagrado ao profeta, marca o fim do período de ignorância da humanidade e o começo de um tempo iluminado por Deus e sua mensagem.
El Din, que circula entre várias mesquitas em São Paulo e ao redor da cidade, como as de Santo Amaro, São Miguel, São Bernardo do Campo, além da Mesquita Brasil, a maior do País, conta que, além das cinco orações diárias, as mesquitas também realizam palestras e leituras do Alcorão no Ramadã. Neste período, diz, os templos nacionais também receberão oito xeques vindos do Egito especialmente para participar das celebrações.
Nos períodos de maior lotação das mesquitas, conta El Din, que acontecem às sextas-feiras de noite e nos finais de semana, os templos chegam a receber de 200 a 400 pessoas para as orações. O islamismo prega que seus seguidores devem fazer cinco orações diárias, mas, durante ao Ramadã, também são realizadas orações extras. As mesquitas também costumam realizar jantares nos finais de tarde para que os fiéis possam quebrar o jejum reunidos.
O libanês Hassan Bourgi, xeque da mesquita do Brás, na capital paulista, revela que alguns muçulmanos têm dificuldades para seguir o Ramadã devido às diferenças de costumes com a sociedade brasileira, mas que isso não os impede de praticar o jejum. "A maioria dos muçulmanos já está esperando pelo jejum e se preparando para o Ramadã, que é uma ocasião muito especial", afirma.
"Jejuar é um modo de obedecer à palavra de Deus e há também benefícios sociais, as pessoas se visitam mais, se ajudam mais. Os muçulmanos no mundo também se sentem mais fortes porque estão fazendo a mesma coisa ao mesmo tempo", destaca Bourgi. Ele conta que nos dois últimos meses a mesquita ofereceu lições semanais a homens, mulheres e crianças para explicar o significado espiritual do Ramadã e o modo como os fiéis devem se comportar durante este mês. "À noite, quando as pessoas saem do trabalho, há cerca de 200 pessoas para o jantar e a oração", conta, sobre o Ramadã na Mesquita do Brás.
O empresário Kamal Osman afirma que, para ele, não há diferenças em relação a seguir o Ramadã no Brasil ou em um país islâmico. "Tudo depende da sua fé. Se você tem fé, não importa o país onde você vai fazer o jejum", ressalta. "Esse jejum é realizado em benefício do ser humano. Ele engrandece a pessoa que o pratica porque ela está sendo obediente a Deus", diz.
Morador de Foz do Iguaçu, no Paraná, Osman nasceu no Líbano, mas se considera brasileiro. Para ele, fazer o jejum durante o período de frio ajuda a aliviar as dificuldades de se ficar sem comer ou beber. "Esse ano, fomos beneficiados porque vai ser no inverno. São dias mais frescos e devemos jejuar por 12 horas, mas já jejuamos por 16 horas no calor em dezembro", diz. A cada ano, o mês do Ramadã acontece em períodos diferentes do calendário gregoriano.
Osman diz que, no Ramadã, vai diariamente à mesquita para orar. "Todos os dias janto com minha família ou chamamos outras pessoas para quebrar o jejum com a gente. Nos sábados, quebramos o jejum na mesquita", conta. "Fazer o jejum é ter esperança, paciência e perseverança. Ele desenvolve muita coisa no ser humano", afirma.
Faisal Ismail, presidente do Centro Cultural Beneficente Islâmico de Foz do Iguaçu, diz que a comunidade muçulmana da cidade é de 22 mil pessoas e que há nela vários brasileiros convertidos ao Islã. Segundo ele, as orações da noite costumam reunir uma média de cem pessoas, já a da madrugada, que ocorre às 4h30, chega a ter 300 fiéis.
"O Brasil é um país como qualquer outro. Há países em que é mais difícil se adaptar. No Canadá, por exemplo, se jejua por quase 20 horas. No Brasil, é cerca de 12 horas. Existe uma ausência de alimentação, mas o fundamental é o espírito, é sentir a necessidade daquele que não tem alimento", explica.
Ele conta que esta semana o centro inicia um ciclo de palestras para os jovens sobre o Ramadã e os cinco pilares do Islã. "Esperamos que mais de cem jovens participem do curso", revela. Para Ismail, o corpo humano se adapta ao jejum. "O relógio biológico hoje é o relógio das orações. A base da nossa rotina está baseada nas cinco orações. Assim, você está sempre perto de Deus".