Alexandre Rocha
São Paulo – O Mercosul quer retomar a negociação de um tratado de livre comércio com o Conselho de Cooperação do Golfo (GCC) já em setembro, depois do período de férias no mundo árabe e antes do Ramadã, mês sagrado para os muçulmanos que este ano começa por volta do dia 22 de setembro. A idéia é organizar uma reunião entre representantes dos dois blocos em Riad, capital da Arábia Saudita.
O Brasil acaba de assumir a presidência rotativa do grupo sul-americano e pretende recolocar as negociações com outros blocos regionais no topo da pauta diplomática. A retomada destes processos ganhou mais força ainda com o fracasso das negociações da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Embora pouca coisa tenha ocorrido no primeiro semestre no que diz respeito às conversas entre o Mercosul e o GCC, os negociadores do Itamaraty prevêem poucas dificuldades nas negociações. Isto porque, na avaliação da diplomacia brasileira, as economias são complementares e existem poucos setores sensíveis, ou seja, nos quais os dois blocos são concorrentes.
O Mercosul já encaminhou ao GCC as propostas de textos jurídicos sobre regras de origem, àquelas que determinam a porcentagem de insumos locais que determinado produto deve ter para ser isento de tarifas; salvaguardas, que são mecanismos de defesa comercial; e resolução de controvérsias.
Com a parte jurídica razoavelmente encaminhada, os negociadores acreditam ser possível, já em setembro, discutir a liberalização do comércio em si. O Itamaraty prefere não discutir produto a produto, o que pode tomar muito tempo, mas fazer uma negociação global e depois, se for o caso, colocar setores sensíveis como exceções ao acordo.
A avaliação da diplomacia brasileira é de que poderá se chegar perto dos 100% de liberalização do comércio bi-regional. Embora o assunto ainda vá ser discutido entre os membros do bloco sul-americano em agosto, os negociadores do Brasil acreditam que a proposta do Mercosul será "ambiciosa".
Para justificar esta confiança, o Itamaraty toma como base uma pesquisa feita no início do ano pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Na época, o ministério pediu às entidades representativas do setor privado que indicassem quais os produtos gostariam de ver nas listas de negociação.
A resposta, segundo os negociadores, foi uma ampla gama de setores, incluindo bens de consumo em geral, máquinas e equipamentos, automobilístico, agrícola, calçadista, têxtil, entre outros. A liberalização poderá trazer bons ganhos para as empresas brasileiras que ganhariam mais competitividade nos mercados do Golfo.
Inicialmente esperava-se que as negociações teriam algum tipo de andamento no primeiro semestre, o que acabou não ocorrendo, segundo o Itamaraty, por problemas de agenda. Os negociadores brasileiros, no entanto, ainda acreditam na possibilidade de uma conclusão para o acordo já este ano.
Investimentos
Paralelamente ao tratado, o Mercosul, a pedido do GCC, pretende realizar um seminário sobre investimentos nos países do bloco sul-americano. De acordo com o Itamaraty, com o petróleo em alta, os países do Golfo, a maioria grandes produtores da commodity, estão buscando novos destinos para investir, além dos Estados Unidos e da Europa.
Na avaliação dos negociadores, o próprio acordo poderá chamar mais a atenção dos árabes para as oportunidades de investimentos na América do Sul. Mesmo assim, não se descarta a inclusão de cláusula no tratado prevendo o acesso sem barreiras dos investimentos recíprocos.
O Itamaraty espera também a retomada das negociações comerciais entre o Egito e o Marrocos. Com os representantes do Marrocos, os negociadores brasileiros querem marcar uma reunião tão logo seja possível.
O Mercosul é formado por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e no início do mês a Venezuela passou a fazer parte do grupo. Do GCC fazem parte Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã.
O bloco sul-americano tem mais de 250 milhões de habitantes, um Produto Interno Bruto (PIB) superior a US$ 1 trilhão e um volume de comércio de mais de US$ 300 bilhões, de acordo com o Itamaraty. Já o bloco árabe tem um PIB somado de US$ 576,8 bilhões, uma população de 36,5 milhões de pessoas e um comércio global de US$ 510,4 bilhões, incluindo exportações e importações.