Alexandre Rocha
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São Paulo – A missão comercial ao Norte da África, realizada entre o final de maio e o início de junho deste ano pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira e pela Agência de Promoção das Exportações e Investimentos do Brasil (Apex), se tornou uma referência no que diz respeito ao bom nível de sua organização e ao profissionalismo de seus integrantes. Esta foi uma das conclusões tiradas ontem (16) na reunião de participantes da viagem que ocorreu na sede da Câmara Árabe, em São Paulo.
"Ela criou uma nova referência em missões por causa do profissionalismo, da colaboração, da integração, do bom humor e da amizade criada entre seus integrantes", disse o vice-presidente de marketing da Câmara Árabe, Rubens Hannun, líder da delegação que passou pelo Marrocos, Tunísia e Egito. "O fato de estarmos aqui demonstra isso, pois sabemos como é complicado achar tempo para comparecer a uma reunião como esta", acrescentou. Alguns dos participantes vieram de cidades do interior de São Paulo e até de outros estados, como Paraná e Paraíba.
"Do nosso lado ela cumpriu as expectativas e queremos repetir isso. Por um conjunto de fatores ela foi inédita", declarou o analista de projetos da Apex, Ricardo Santana, acrescentando que a parceria entre a agência e a Câmara Árabe está cada vez mais forte.
O objetivo da reunião foi fazer um balanço do desenrolar dos contatos feitos na missão, ressaltando os acertos e dificuldades, para encontrar formas de auxiliar os empresários na continuidade dos negócios e na formulação de ações que possam ser utilizadas em eventos futuros. "É extremamente importante que os contatos feitos tenham continuidade, tenham sido realizados negócio ou não, para que a gente possa montar uma imagem do Brasil lá fora, mostrar que o país é sério", destacou Hannun.
Ele ressaltou, por exemplo, que após a missão ficou acertada a vinda ao Brasil, ainda este ano, de delegações de empresários do Egito e da Tunísia, e que a experiência adquirida pelas empresas brasileiras pode ajudar no sucesso destes próximos encontros.
Ficou claro para os representantes das companhias brasileiras que o comércio com os países da região é uma via de mão dupla. Além de vender, é importante também buscar oportunidades de importação e de parcerias empresariais. "Devemos aproveitar estas missões de vinda para promover o comércio bilateral", observou o empresário Paulo Roberto Cavalcante, da PMAN, que produz insumos para a indústria de panificação.
O representante do Instituto Brasileiro de Frutas (Ibraf), Paulo Passos, por exemplo, afirmou que o setor vê grandes possibilidades de negócios na região, porque o volume que estes países importam é expressivo e a participação brasileira no mercado ainda é tímida. No entanto, existe a concorrência de produtos europeus e dos próprios países árabes.
"Mas existe a possibilidade real de que empresas brasileiras enviem polpas de frutas para que sejam embaladas lá, ganhando em preço e condições de concorrer", disse Passos. De acordo com ele, o instituto pretende apresentar uma proposta aos seus associados para a formação de um pool de companhias que possam estabelecer uma unidade industrial no Norte da África.
No mesmo sentido, Maurício Manfré, da Associação Brasileira da Indústria de Equipamentos Médicos, Odontológicos e Laboratoriais (Abimo), disse que identificou um potencial de negócios muito bom para o seu segmento. A Tunísia, por exemplo, por ser um país pequeno, surpreendeu a maioria dos participantes pelas oportunidades que apresenta. "O país pode ser bom não só como importador, mas também como plataforma para outros mercados", afirmou.
Em setembro, a Abimo vai realizar uma missão comercial ao Egito e Manfré disse que a viagem ao Norte da África triplicou o interesse dos empresários locais pelos equipamentos brasileiros. "Já temos 45 distribuidores inscritos para participar dos encontros, isso mostra o impacto que a viagem teve, pois os empresários de lá passaram a se interessar mais pelo Brasil", declarou. Ontem Hannun mostrou uma série de notícias sobre a passagem da delegação brasileira publicadas em jornais do Marrocos, Tunísia e Egito.
Negociações
Edmilson Marcondes dos Santos, dono da USmatic, fabricante de hidrômetros e equipamentos para irrigação, foi para a missão já com o objetivo de firmar uma parceria industrial no Norte da África. "Encontrei pessoas bastante interessadas e estou mantendo contatos, mas muitas vezes eles demoram para responder", disse.
O secretário-geral da Câmara Árabe, Michel Alaby, explicou que os empresários árabes têm um "timing" diferente, gostam de negociar e geralmente as tratativas tomam mais tempo do que os brasileiros estão acostumados. "Mas é importante insistir, porém sem pressionar para não perder o negócio", afirmou. "É preciso paciência e perseverança", acrescentou.
Na avaliação do representante da Associação Brasileira das Indústrias de Componentes para Couros, Calçados e Artefatos (Assintecal), Diogo Serafim, a missão rendeu oportunidades de bons negócios para o setor, especialmente nas áreas de couros reciclados e produtos químicos para curtumes. Ele ressaltou, no entanto, que as mercadorias européias entram no mercado norte-africano em condições bastante competitivas, uma vez que a União Européia mantém acordos comerciais com os países visitados. "Existe uma série de incentivos e o Brasil precisa buscar isso também", afirmou.
Vários dos empresários presentes falaram da necessidade do Brasil negociar acordos do gênero. O Mercosul já iniciou negociações para tratados de preferências tarifárias com o Marrocos e com o Egito, mas eles não foram concluídos. Para Michel Alaby, o Brasil precisa agora buscar cada vez mais acordos bilaterais, uma vez as negociações multilaterais da Rodada Doha não deram resultado.
Ricardo Santana acrescentou que a Apex acaba de criar um núcleo para tratar do relacionamento da agência e de seus parceiros com outros órgãos do governo, como o Itamaraty, que é responsável pelas negociações diplomáticas.
Sérgio Teizen, da fábrica de ferramentas Starret, disse que o Brasil precisa reforçar sua imagem no exterior, por meio, por exemplo, da criação de selos que atestem a responsabilidade social da empresa e sua preocupação com o meio ambiente.
Márcio Lario, da Nitriflex, fabricante de borrachas sintéticas, sugeriu que as entidades setoriais do Brasil e dos outros países troquem mais informações sobre seus respectivos ramos, para disponibilizar maior conhecimento dos mercados aos empresários. No mesmo sentido, Damaris Ávila da Costa, da trading Braseco, propôs que os organizadores de missões induzam as empresas e pesquisar mais sobre o potencial para os seus produtos em outros países.
Uma das idéias que surgiram durante a reunião foi a de que as companhias passem a informar quais foram os empresários de maior peso com que travaram contato durante uma missão, para que depois eles possam ser convidados a vir ao Brasil em Projetos Comprador organizados pela Apex.
Para Eduardo Moraes, da trading Latinex, de alimentos e bebidas, a missão o levou a buscar novas opções de produtos para oferecer ao mercado norte-africano. De acordo com ele, na área de alimentos prontos para o consumo há grande concorrência de mercadorias européias e locais. Sua intenção é oferecer mais matérias-primas.
Algumas empresas, como a Nitriflex e a Braseco, fecharam negócios já durante a missão. Mas os contatos continuam. A idéia dos empresários é manter negócios de longo prazo, não apenas fazer vendas eventuais. Márcio Lario disse que nomeou um distribuidor no Egito e espera para logo a resposta de um empresário tunisiano sobre a aprovação de seus produtos no país.
Damaris, da Braseco, disse que está para fechar a venda de 120 mil toneladas anuais de açúcar para o Egito e de 7 mil toneladas mensais para o Marrocos. Ela acrescentou que há também grande demanda por máquinas agrícolas na região, porém de pequeno porte, e busca fabricantes que possam fornecer estes equipamentos. A empresa já vende vidros para o Egito e espera fechar a exportação de portas de madeira maciça.
Ivini Granado, da Predilecta, que fabrica doces, condimentos e polpas, afirmou que 10% dos contatos que fez durante a missão estão "ativos" e espera vender goiabada e atomatados para o Marrocos e Egito em breve. "Estamos negociando o preço, mas colocar os produtos lá é a idéia da Predilecta", disse.
Para Hannun, a reunião de ontem serviu para discutir as oportunidades e angústias vividas pelos empresários após a missão. "A cooperação, a troca de informações e a apresentação de sugestões foram características da missão", afirmou. Edmilson dos Santos, da USmatic, disse que este relacionamento gerou até negócios entre as empresas participantes. "E ontem foram apresentadas sugestões de efeitos práticos e rápidos, o que mostrou que uma missão não acaba nela mesma", acrescentou Hannun.