Alexandre Rocha
São Paulo – Bastou uma semana viajando pelo estado de São Paulo para que os estudantes sauditas que estão no Brasil fazendo intercâmbio mudassem completamente sua visão sobre o país. Antes a imagem que tinham era de uma nação pouco desenvolvida, marcada pela violência urbana e tendo o futebol como um de seus únicos atrativos. Agora os 18 jovens vão levar na bagagem lembranças de um país altamente industrializado, com uma agricultura forte, avançado tecnologicamente e habitado por um povo extremamente amigável.
"Nós vimos indústrias muito avançadas e as pessoas têm sido muito amigáveis. Não vi isso em nenhum dos países que já visitei", disse o estudante de medicina, Saud Aldobyan, de 21 anos, que já esteve nos Estados Unidos, na Grã-Bretanha e em países árabes como Síria e Bahrein. "Vamos voltar com outra imagem e falar sobre isso em nossas universidades, para que os outros lá saibam também", acrescentou ele, que estuda na Universidade Rei Khalid, em Abha.
Durante a semana passada eles visitaram o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciência Humanas (FFLCH), a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), todas instituições vinculadas à Universidade de São Paulo (USP); a Usina Costa Pinto de açúcar e álcool, em Piracicaba; o Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) e uma fazenda de café, em Campinas; a Embraer e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos; as redes de TV Globo e Bandeirantes; a Escola Islâmica Brasileira e a Mesquita Brasil, na capital paulista.
A visita à fábrica da Embraer foi uma das que mais impressionou o estudante de engenharia aeroespacial Saif Hamed Almutairi, de 21 anos. "Na Arábia Saudita nós não temos fábricas de aviões, então aprendemos na teoria, mas aqui vimos a realidade", declarou ele, que estuda na Universidade Rei Fahd, em Medina.
Escola
Os jovens perceberam também que apesar de estarem longe de casa, sua cultura se faz presente. Afinal o Brasil tem a maior colônia de árabes e descendentes fora do mundo árabe. As visitas na sexta-feira (19) à escola Islâmica, localizada na Vila Carrão, zona leste da Capital, e à Mesquita Brasil, no Cambuci, foram marcantes. Alguns dos jovens até se vestiram com seus trajes sauditas para passar o dia. "Colocamos esta roupa para visitar a escola e a mesquita", disse Almutairi, que estava vestido com o tradicional camisolão branco, chamado "abaya", e o turbante vermelho e branco (kafiyi) preso com uma rodinha de tecido preto (agal).
"Hoje (sexta-feira) foi o melhor dia da viagem", disse o estudante de medicina da Universidade Ummalqura, de Meca, Ayman Sajjad Alhsan, de 21 anos. "Primeiro porque eu não imaginava que existisse uma escola assim no Brasil. Depois porque é bom ver que existe uma escola que ensine o árabe e religião (islâmica) em um país tão distante", acrescentou.
A Escola Islâmica, que oferece educação desde o jardim de infância até o 3° colegial, conta, além do currículo brasileiro tradicional, com aulas de árabe e religião muçulmana. Ela tem 400 alunos, sendo que 300 são muçulmanos. Os universitários passaram quase toda a manhã de sexta-feira no colégio e trocaram idéias com as crianças e adolescentes.
"Foi muito importante receber os estudantes sauditas aqui, porque eles estão bem avançados em seus estudos e podem incentivar nossos alunos a pensar mais no futuro", disse o xeque Mohammad Ahmad Amame, coordenador de árabe, religião e ética de escola. Os 18 universitários que compõem o grupo foram selecionados para a viagem de intercâmbio por terem as melhores notas do país árabe. A visita é patrocinada pelo Clube Científico da Arábia Saudita, como o apoio da Câmara de Comércio Árabe Brasileira (CCAB).
Religião
Depois da escola, mais uma surpresa: a visita à mesquita, onde os jovens puderam participar da tradicional reza de sexta-feira e ouvir o sermão do xeque Abdulfatah El Bezm, de Damasco, capital da Síria. O jovem Ayman e o diretor-executivo do Clube Científico, Abdulhafeez Ameen, foram convidados, inclusive, pelo presidente da Sociedade Beneficente Muçulmana, Nazih Said Saadi, a fazer o "adzan", ou o chamamento para a reza.
"Esta é uma das melhores viagens internacionais que já fizemos. Como as pessoas são amáveis, nem nos sentimos fora do nosso país", disse Ameen. "O governo brasileiro dá liberdade para todas as religiões, é uma das melhores coisas do país", acrescentou. Durante seu sermão, o xeque Abdulfatha destacou que o Brasil é um país que trata bem os imigrantes. "Isso mostra que nossos irmãos que vieram para cá estão bem", destacou o religioso.
Ameen ressaltou que a imagem que os estudantes agora têm do Brasil será divulgada pela Arábia Saudita e ao redor do mundo árabe, já que uma equipe de TV acompanha a viagem com a intenção de fazer um documentário. "E isso talvez incentive outras pessoas e visitarem o país", concluiu.
No sábado, os universitários ainda visitaram o Hospital do Coração, em São Paulo, e mais tarde seguiram para Foz do Iguaçu. Eles ainda vão visitar Brasília, o Amazonas e o Rio de Janeiro. "Estamos ansiosos por ver novas coisas, como a natureza", disse Saud Aldobyan.