Brasília – A partir de janeiro, o embaixador Cesário Melantonio Neto assume a função de emissário especial do Brasil para o Oriente Médio e mais a Turquia e o Irã. Pela frente, o diplomata, com mais de 40 anos de profissão, prevê ainda um longo período de tensão na região aliado às articulações para evitar o agravamento da violência. Segundo ele, o desafio do Brasil é manter a posição não intervencionista e a defesa do diálogo como alternativa de negociação.
Nos últimos dias, ainda como embaixador brasileiro no Cairo, capital do Egito, Melantonio Neto esteve às voltas com as eleições parlamentares no país e as negociações para encerrar o impasse na Síria. A seguir, os melhores trechos da entrevista do diplomata à Agência Brasil.
Agência Brasil – Como será o trabalho do senhor na função de emissário especial para o Oriente Médio e mais Turquia e Irã?
Cesário Melantonio Neto – Não é uma função nova. No passado, foi desempenhada pelo embaixador [já aposentado] Afonso de Ouro Preto. Como conheço bem a região, por ter sido embaixador no Irã, na Turquia e agora no Egito, fui designado para essa função. A posição do Brasil é historicamente a não intervencionista. Defendemos o diálogo e a busca pacífica pelas soluções de impasses.
Antes da captura e morte do ex-líder líbio Muammar Khadafi o senhor foi até a Líbia negociar com os integrantes do Conselho Nacional de Transição (CNT). O que se diz em um momento de tanta tensão e disputa?
Em todas as conversas que tenho, seja aqui [no Egito], com as autoridades da Liga Árabe, ou na Líbia, costumo lembrar que todos os processos revolucionários são lentos e passam por um momento de transição. No Brasil mesmo passamos por uma longa fase desde o fim do autoritarismo até a redemocratização. Mas acredito, sinceramente, que ainda levará muito tempo para esses processos todos serem concluídos.
Parece tão distante, o Brasil, na América do Sul, participar das negociações de paz na região. Por que o tema é tão caro ao Brasil?
O Brasil integra o grupo denominado Aspa (América do Sul e Países Árabes), cujo objetivo principal é a integração dessas áreas. Em setembro de 2012, a Aspa se reunirá em Lima, no Peru. Nós nos preocupamos com as dificuldades de todos os países membros e, nesse caso, a distância não deve ser observada como uma dificuldade.
Observando do Ocidente, a impressão que se tem é que a situação crítica se concentra na Síria. Mas isso é real?
Não. Há vários pontos de tensão. Os movimentos de reação popular são intensos não só na Síria, como também na Arábia Saudita, na Turquia, no Irã e outros. Estou permanentemente em conversa com a Liga Árabe [que reúne 22 nações, inclusive a Síria, que está temporariamente suspensa] para saber como estão as negociações. O Brasil apoia o trabalho da Liga Árabe e coloca-se à sua disposição.
O senhor disse que prevê ainda um longo período até encerrar essa tensão toda…
Sim. Os processos revolucionários ao longo da história já se mostraram lentos e graduais. No caso do Ocidente, o melhor exemplo disso é a Revolução Francesa [1789-1799]. Por isso, quando me perguntam se esses movimentos continuarão, respondo sempre: “Ainda vai levar muito tempo”.