São Paulo – A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, esteve em Rabat, capital do Marrocos, nesta quinta-feira (08) e falou sobre a economia dos países árabes em transição, ou seja, os afetados pela Primavera Árabe de 2011. Em discurso ao Conselho Econômico, Ambiental e Social marroquino, ela defendeu o fortalecimento das pequenas e médias empresas, da classe média e uma “via do meio” para o papel dos governos, nem tão intervencionistas, nem excessivamente liberais.
“A boa notícia é que a situação econômica nos países árabes em transição está melhorando, com exportações maiores, mas investimento público e sinais de que os investimentos privados vão crescer”, declarou Lagarde. “Países como o Marrocos estão colhendo os frutos de seus esforços de diversificação e promoção das exportações e dos investimentos estrangeiros, especialmente em áreas de alto valor agregado, como as indústrias automobilística, aeronáutica e de eletrônicos”, acrescentou.
Dito isto, ela destacou que a estabilidade econômica sozinha não é suficiente, pois estas nações sofrem “uma crise de empregos de efeitos devastadores”, com o desemprego na faixa de 13% em média, sendo que o percentual sobe para 29% entre os jovens, uma das mais altas taxas do mundo. Desde 2012, segundo Lagarde, o número de desempregados aumentou em 1,5 milhão de pessoas.
Para a diretora do Fundo, estas nações têm que dobrar o crescimento anual médio, que está na casa de 3%, para haver maior geração de empregos. Vale lembrar que o bloco citado é bastante diverso, inclui desde países que não tiveram mudanças de regime, como Marrocos e Jordânia, até casos como o da Síria, que está em guerra civil.
Nesse sentido, ela defendeu o fortalecimento dos “pilares centrais” da economia. Um destes pilares é representado pelas pequenas e médias empresas, que são “a espinha dorsal e principais geradoras de empregos de uma economia saudável”.
Lagarde ressaltou que nas nações árabes em transição a economia formal é dominada por poucas empresas de grande porte e o nível de informalidade varia de 17% na Jordânia a 35% na Tunísia.
Outro ponto central é o fortalecimento da classe média que, de acordo com ela, em países como Egito, Jordânia e Marrocos, tem uma fatia menor das riquezas hoje do que tinha na década de 1960. “Permitam-me falar francamente: os dividendos do crescimento costumeiramente foram para os ricos e muitas pessoas foram deixadas de lado”, afirmou.
A diretora do FMI observou que a experiência internacional mostra que uma classe média forte é necessária para impulsionar a economia. “Uma classe média forte torna a sociedade mais coesa, estável e próspera. Uma classe média forte é também onde surgem os empreendedores de que precisamos na economia de hoje”, disse.
No que diz respeito ao estado, Lagarde destacou que os governos “devem dar um passo atrás em algumas áreas e um passo a frente em outras”, o que significa conceder menos subsídios e ampliar a rede de proteção social. Os subsídios aos alimentos e combustíveis são comuns no mundo árabe. Ela defendeu que os recursos sejam direcionados a programas sociais, saúde, educação e investimentos públicos.
“O mais importante, provavelmente, é que [o estado] precisa se tornar menos empregador e mais um eficiente e imparcial regulador e fomentador do setor privado, que é a verdadeira fonte de empregos”, destacou a executiva.
Na avaliação de Lagarde, fortalecer estes pilares centrais significa tonar a economia “mais participativa” e com “menos privilégios”.
Políticas
Ela sugeriu a adoção de uma série de políticas nesse sentido, como facilitar a abertura de empresas por meio da redução da burocracia, aumentar a oferta de crédito, reduzir barreiras tarifárias e não tarifárias ao comércio, oferecer capacitação aos jovens para o mercado de trabalho, reduzir os encargos trabalhistas e fortalecer a participação das mulheres na economia.
Nesse último ponto, a diretora do FMI disse que a diferença entre a participação masculina e a feminina no mercado de trabalho do Oriente Médio e Norte da África é três vezes maior do que na média das nações em desenvolvimento. “É imperativo remover obstáculos obsoletos e adotar políticas propícias para que as mulheres deem sua contribuição”, ressaltou. “Afinal, foi Ibn Rushd que disse que ‘tratar as mulheres como fardo para os homens é uma das causas da pobreza’”, acrescentou ela, referindo-se a Averróis, filósofo árabe redescobridor de Aristóteles na Idade Média.
Lagarde sugeriu ainda maior transparência e a adoção de boas práticas na administração. E isso vale tanto para o setor público como o privado. Segundo ela, mais de metade das empresas no Oriente Médio e Norte da África declaram ter recebido pedidos de propina.
De acordo com o FMI, o discurso da diretora-geral foi uma prévia dos temas que serão discutidos na conferência regional Construindo o futuro: empregos, crescimento e igualdade no mundo árabe, que será realizada nos dias 11 e 12, em Amã, na Jordânia. O evento é promovido pelo FMI, governo jordaniano e Fundo Árabe para o Desenvolvimento Econômico e Social.
Lagarde concluiu dizendo que o FMI é parceiro das nações árabes em transição na busca por reformas. Ela declarou que a instituição realizou 55 missões técnicas na região em 2013 e se comprometeu com mais de US$ 10 bilhões em apoio financeiro.