São Paulo – A curadora brasileira Monica Hirano fará uma residência de três meses na Kaaysa Art Residency, na praia de Boçucanga, em São Sebastião, litoral de São Paulo, para pesquisar como as diásporas, sobretudo dos países orientais, se adaptaram aos territórios tropicais, especialmente o Brasil. Intitulada “Orientes nos trópicos”, a investigação deverá resultar em um artigo e até levar a exposições e criações artísticas, algo que ainda está indefinido.
“Fiquei pensando sobre como eu poderia contribuir com as minhas andanças no mundo. Morei três anos na Índia e sou descendente de japonês. Pensei como eu queria amarrar essas histórias, essas vivências”, diz a artista. “E com essa palavra orientalismo, comecei a pensar o quanto coloca-se no mesmo lugar tudo o que está ao leste da Europa como se fosse o mesmo conceito. O Oriente Médio é considerado Oriente e a Ásia é a considerada Oriente. Esses dois lugares geopolíticos são completamente diversos”, diz ela, citando o termo pesquisado e discutido pelo crítico literário palestino Edward Said (1935-2003).
Em texto que apresenta a pesquisa, a artista define a residência como “espaço de fricção” entre mundos: “onde o Oriente não é um ‘outro’ distante, mas presença ativa — e por vezes invisível — no cotidiano brasileiro, do alimento à arquitetura, da medicina aos rituais”.
Para desenvolver esse projeto, Monica e a Kaaysa convidarão artistas e curadores que desenvolvem trabalhos relacionados a Oriente e diásporas e vivem no Brasil. Esse projeto integra o programa Jovem Curador, que apoia a participação de curadores emergentes. Lá, no litoral paulista, esses artistas poderão trocar experiências com Monica, mas a iniciativa ainda carece de patrocínio. A Kaaysa Art Residency foi criada em 2017 no litoral norte de São Paulo por Lourdina Jean Rabieh para receber artistas de diversos locais, correntes de pensamento e habilidades. Já recebeu, entre outros, artistas plásticas árabes.
O questionamento sobre como as diásporas se adaptaram no Brasil, diz Monica, surgiu de estudos e até experiências pessoais. Sua avó, japonesa e de religião xintoísta precisou se converter ao catolicismo no Brasil para que seus filhos pudessem estudar. Monica já morou na Índia, Itália e Egito, locais em que estudou, vivenciou a cultura e se inseriu nos circuitos das artes.
No Egito, foi cocuradora da mostra Something Else, em 2023, no Cairo. Estudou árabe, “uma das línguas mais poéticas que existem”, e diz que há estigmas que precisam ser quebrados, um dos objetivos do seu estudo. “Nunca me senti tão segura na minha vida como me sinto no Egito porque sei que as pessoas estão fundamentadas em princípios de amor e fraternidade muito diferentes do que a gente tem aqui”, diz.
Ao se reunir com artistas que investigam o Oriente e o orientalismo, o objetivo é também mapear qual a arte contemporânea feita no Brasil que explora esse tema e contribuir para a formação do pensamento sobre o assunto. A residência começa ainda neste mês e termina em agosto. Mais informações sobre patrocínio, intercâmbio artístico e residências, neste e-mail.
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